A inteligência artificial (IA) não é mais apenas inovação tecnológica. Ela se tornou a infraestrutura invisível da ciência, da economia e da sociedade. Em 2024, a IA entrou para a história da ciência ao estar presente em dois Prêmios Nobel: de Química, pelas descobertas viabilizadas por algoritmos no design de proteínas artificiais, e de Física, pelas simulações complexas que desvendam mistérios do Universo. A IA, antes coadjuvante, agora é protagonista das maiores transformações científicas do nosso tempo.
Enquanto o mundo acelera, o Brasil ainda hesita. E essa hesitação tem preço: o atraso. O “Future of jobs report 2025”, do Fórum Econômico Mundial, mostra que 91% das empresas brasileiras já usam IA, mas também revela um paradoxo alarmante: a maior barreira para o avanço da inovação no país é a escassez de talentos preparados. Adotamos tecnologias, mas sem capacitar as pessoas. É como tentar construir arranha-céus sobre um alicerce de areia.
O mesmo relatório aponta que 89% dos empregadores brasileiros planejam requalificar suas equipes nos próximos cinco anos. Parece promissor, mas, sem uma política coordenada — envolvendo governo, setor produtivo e educação —, será insuficiente. A IA pode ser o motor de crescimento ou o agente da exclusão em massa. O que definirá o rumo do país são as escolhas que fizermos agora.
A comparação com a Revolução Industrial é inevitável. Na época, os países que lideraram a transição colheram prosperidade e protagonismo. Os que hesitaram colheram dependência. A diferença é que, hoje, a transição acontece em velocidade exponencial. A IA não apenas muda profissões; ela transforma a natureza do trabalho, da aprendizagem, da criatividade e até da cidadania.
- Inteligência Artificial: respire fundo, 2027 vem aí
É urgente revisar a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), inserindo competências digitais de forma transversal desde o ensino fundamental e incluindo temas como alfabetização em IA, ética digital, pensamento computacional e habilidades socioemocionais, como empatia e pensamento crítico. A escola brasileira ainda prepara jovens para o século XX, enquanto o mundo já vive o XXI.
Mas currículo não muda a realidade. Não se faz educação de qualidade sem professores. É preciso criar um Programa Nacional de Formação Docente para a Era Digital, que não seja apenas técnico, mas também humano, interdisciplinar e criativo. O educador precisa deixar de ser apenas transmissor de conteúdo para se tornar mentor de trajetórias num mundo mediado por algoritmos.
O desafio não se restringe aos bancos escolares. Precisamos de um plano nacional de requalificação profissional em larga escala, voltado especialmente aos trabalhadores nos setores mais ameaçados pela automação. Isso inclui parcerias com o setor produtivo, o Sistema S, universidades, redes públicas e plataformas on-line, com foco em empregabilidade real e transição justa.
A boa notícia é que ainda há tempo. Mas não muito. A IA está em movimento — e não espera países indecisos. O futuro não será decidido pelas máquinas, mas pelas nações que souberem preparar seu povo para conviver, criar e prosperar com elas. Ignorar essa revolução não é neutralidade. É, objetivamente, escolher o atraso.
*Luiz Cláudio Costa é pesquisador de IA na educação. Foi ministro interino da Educação no governo Dilma, secretário executivo do MEC e reitor da Universidade Federal de Viçosa