Posso afirmar que esta edição aqui, todo mundo, lá no íntimo, acabou colocando um pouquinho de fé; a esperança de um bom resultado. Além de ser escrita por J. Michael Straczynski e desenhada e colorida por Juan Ferreyra, a história elenca “apenas” o Motoqueiro Fantasma trocando socos com Galactus, um confronto entre forças cósmicas de naturezas tão opostas que instiga qualquer um, afinal, quem não gostaria de ver o Devorador de Mundos, uma entidade que consome a vitalidade de planetas inteiros, se segurando para não estraçalhar Johnny Blaze, o Motoqueiro Fantasma, movido por sua missão de castigar almas segundo um código singularmente infernal de justiça?
A trama tem um ótimo início, ancorado em um projeto visual que evoca o passado e mergulha o leitor rapidamente na história, que se passa na oficial Terra-616. As cores e traços de Ferreyra criam uma atmosfera que mescla o fantástico com o familiar, permitindo que o plano cósmico e os encontros entre personagens fluam com bastante naturalidade. A interação inicial entre Motoqueiro Fantasma e Coisa, por exemplo, é marcada por um humor leve e genuíno, que captura a essência de um encontro casual entre heróis sem a necessidade de grandes estripulias visuais ou dramáticas. Essa abertura estabelece um tom despretensioso que consegue preparar o terreno para o conflito central, ainda que com algumas limitações que se revelam ao longo do texto.
Essa força visual permanece consistente ao longo de toda a edição, com o artista entregando painéis que destacam tanto a imponência de Galactus quanto a energia sobrenatural do Motoqueiro Fantasma. A primeira metade da narrativa, em particular, brilha ao combinar uma estética escrupulosa com a hilária dinâmica entre os heróis, tomando outro rumo quando o Coisa sugere que Blaze utilize seus poderes de julgamento de uma maneira inovadora. A transição de Johnny Blaze para o espaço, onde ele enfrenta o Devorador de Mundos, carece de construção mais sólida. O dispositivo narrativo que leva o Motoqueiro ao cosmos parece forçado, quase implausível, e não aproveita o potencial de um personagem que tem contatos infernais.
A ideia de justiça que guia Blaze também poderia ter sido explorada com maior profundidade para justificar sua jornada e embate contra Galactus. Em vez disso, os diálogos entre os dois titãs soam simplificados, com Blaze adotando um tom bebezóide, birrento, o que compromete a gravidade do confronto. Essa abordagem contrasta com a riqueza visual da luta, onde o Motoqueiro externaliza uma forma sombria e impactante, destacando-se como um dos pontos altos da edição, mas que não é plenamente sustentado pela escrita. A interação entre os protagonistas e o contexto filosófico trazido pelo Vigia oferece um vislumbre do que a história poderia ter alcançado. As reflexões do cabeçudo, com sua perspectiva infinita, introduzem questões sobre moralidade, poder e responsabilidade que poderiam ter elevado o diálogo entre os lutadores. No entanto, o Motoqueiro, apesar de sua complexidade inerente, não apresenta argumentos à altura de sua própria mitologia. Já Galactus, nem se digna a responder…
Por outro lado, o embate físico é visualmente impressionante, com os desenhos retratando o Devorador em sua imponência, utilizando apenas uma mão para conter o Caveiroso, sugerindo uma disparidade de poder que reforça a natureza quase indiferente do esfomeado. Essa escolha visual sublinha a grandiosidade de Galactus e expõe a fragilidade da narrativa ao posicionar Blaze como um adversário que, apesar de sua relevância, parece incapaz de desafiar verdadeiramente seu oponente. Para mim, se quisesse, Galactus transformaria o Motoqueiro em sopa cósmica em questão de segundos.
Optando por uma resolução mais contida, que privilegia a camaradagem e um certo calor humano, o autor deixa as coisas deslocadas, considerando que escreve uma narrativa intitulada Motoqueiro Fantasma vs. Galactus. Não se exploram as implicações do confronto, o que deixa o leitor com a impressão de incompletude na narrativa. Ainda assim, a obra deixa espaço para reflexões sobre a “necessidade de existência da morte”, algo que parece balela, vinda do discurso professoral de Uatu, mas, em seu sentido geral, é compreensível. Ficam no ar as perguntas sobre como o julgamento de almas e a fome de mundos poderiam, em outra abordagem, redefinir os limites do heroísmo e da destruição, mas não saberemos nada disso. A despeito disso, acho até comemorável que tenhamos uma boa aventura dentre esses trilhões de crossovers da Marvel lançados em 2025. Mas é como diz um ditado de que gosto muito: tudo, não teremos.
Motoqueiro Fantasma vs. Galactus (Ghost Rider vs. Galactus) — EUA, 4 de junho de 2025
Roteiro: J. Michael Straczynski
Arte: Juan Ferreyra
Arte-final: Juan Ferreyra
Cores: Juan Ferreyra
Letras: Travis Lanham
Capa principal: Terry Dodson, Rachel Dodson
Editoria: Will Moss
33 páginas