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sexta-feira, junho 6, 2025

Argentina dá novo fôlego para as múltis brasileiras

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Após anos de resultados negativos, empresas brasileiras de diferentes setores voltaram a apostar na Argentina, à medida que a melhora dos indicadores macroeconômicos do país impulsiona os números operacionais e anima as projeções para os próximos trimestres. A empresa de turismo CVC Corp quase dobrou seus investimentos no país para 2025. A Kepler Weber, do agronegócio, espera, neste ano, quadruplicar o faturamento obtido no país vizinho em 2024. E a Marcopolo, que viu seu volume de entregas crescer 1.000% no primeiro trimestre deste ano, frente ao ano passado, mantém perspectivas positivas para os próximos trimestres.

Dona de uma empresa de turismo e com participação em mais duas marcas na Argentina, a CVC aumentou seus investimentos para R$ 25 milhões no país este ano, quase o total investido nos últimos dois anos combinados, de R$ 30 milhões, na expectativa de que a retomada argentina continue dando resultados.

Desde 2018, quando o grupo de turismo começou a operar na Argentina, registrou lucro anual duas vezes: em 2022, de R$ 4,4 milhões, e em 2024, atingindo o recorde de R$ 24 milhões. A estimativa é crescer ainda mais. A companhia passou a se preparar para reaquecer as operações no país ao observar a retomada econômica gradual, conforme Felipe Gomes, diretor financeiro da CVC.

Ao Valor, ele conta que começou a enxergar a Argentina com outros olhos entre o fim de 2023 e o início de 2024, e implementou novas medidas administrativas. “Isso tudo é um investimento pela crença e pelo que a gente está vendo agora na prática, que vai se manter assim nos próximos meses. Estamos animados.”

Os três primeiros meses de 2025 já sinalizam essa melhora: a empresa lucrou R$ 48,6 milhões no país, aumento de 367,7% sobre o lucro registrado no mesmo período do ano passado, enquanto as receitas cresceram 36%, para R$ 81 milhões. Do total faturado, 22,3% vieram da Argentina, mas Gomes estima que a relação suba para 25% nos próximos trimestres.

O poderio econômico deles [Argentina] mudou nesses últimos dois anos”

— Renato Arroyo

A Kepler Weber, que produz silos, também tem perspectivas altas para suas operações. Para este ano, espera quadruplicar o faturamento obtido no país vizinho em 2024, passando de R$ 5 milhões para cerca de R$ 20 milhões. Entre 2021 e 2023, a Kepler Weber não registrou venda nenhuma em solo argentino.

O ano passado marcou o retorno do país ao “mix” de receitas da companhia, mesmo com uma participação ainda modesta, de 2,5% do faturamento internacional. Hoje, Paraguai e Uruguai são os principais mercados da empresa fora do Brasil, mas cujas produções, somadas, representam um quinto dos volumes da Argentina. “Por que um país tão relevante do ponto de vista de produção de grãos compra muito menos que Paraguai e Uruguai juntos?”, questiona o diretor-financeiro, Renato Arroyo, em entrevista ao Valor.

Ele acredita que o cenário mais favorável observado pela Kepler Weber na Argentina nos últimos meses está associado a um aumento recente do poder de compra da população. “O poderio econômico deles mudou nesses últimos dois anos.”

Junto aos esforços operacionais, o desempenho das empresas também foi resultado da melhora do cenário macroeconômico. Segundo o argentino Roberto Troster, ex-economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e sócio fundador da Troster & Associados, o crescimento da confiança na economia argentina está apoiado em três pilares: a eliminação do déficit público, transformado-o em superávit; o fim do controle cambial; e as reformas para desregulação que têm sido promovidas pelo governo local – fatores que têm contribuído para a queda da inflação e dos juros.

A política de câmbio fixo, que encarecia os produtos para os consumidores argentinos, foi encerrada pelo Banco Central em meados de abril para implementar o câmbio flutuante, o que corrige a distorção e favorece a recuperação gradual dos volumes.

André Mazini, chefe de pesquisa de equity para América Latina do Citi, acredita que a aceleração no setor varejista advém desse efeito, o que pode ser observado nos resultados da Lojas Renner, sediada no Rio Grande do Sul, que voltaram a ser positivos nos últimos trimestres. Mesmo que seja uma operação pequena, o desempenho vem ajudando o resultado do grupo, disse Fabio Faccio, diretor-presidente da varejista que atua desde 2019 no país, na teleconferência de resultados trimestrais.

“Hoje só temos quatro operações na Argentina. Poderíamos ter pelo menos dez vezes mais. Mas, no momento, não estamos fazendo opção dessa expansão. Temos um olhar mais cauteloso para entender se o cenário geopolítico argentino continua em expansão”, comentou Faccio. A Renner não abre resultados por região.

Em solo argentino desde 2011, a JSL é outro exemplo de empresa que espera por sinais mais sólidos para expandir. “Acompanhando os desdobramentos recentes do país, a companhia avalia de forma positiva os sinais de crescimento em sua operação local desde o início de 2024 e segue motivada a considerar oportunidades estratégicas de longo prazo”, diz a empresa em nota enviada ao Valor.

A Marcopolo, fabricante de carrocerias para ônibus e veterana na Argentina, onde está desde 1998, voltou a lucrar no país no ano passado, com R$ 75,7 milhões, sendo que o último resultado positivo havia sido em 2017, de R$ 16,8 milhões.

Há meses a companhia aguardava a retomada dos volumes argentinos devido à expectativa de renovação da frota e volta da demanda reprimida. O país representava volumes importantes e atingiu seu ápice com o afrouxamento de medidas protecionistas durante o governo de Mauricio Macri (2015-2018). O gerente jurídico e de relações com investidores, Eduardo Willrich, conta que as perspectivas continuam positivas, com volumes consistentes, em linha com os resultados observados no primeiro trimestre de 2025.

“A Marcopolo tem investido na Argentina para adaptar sua planta industrial à produção de ônibus urbanos, além dos modelos rodoviários. Adicionalmente, a empresa continua desenvolvendo fornecedores locais e buscando introduzir produtos com maior valor agregado e foco em inovação”, afirma Willrich.

A empresa não foi a única do setor automotivo a “surfar” na melhora argentina. A Frasle Mobility, controlada pela Randoncorp, destaca, em seu balanço do primeiro trimestre, um aumento das exportações para o país, onde tem um centro de operações perto de Buenos Aires. “O ambiente na Argentina segue favorável aos negócios a partir da reabertura do mercado, ainda que com mais competição, onde estamos recompondo estoques, promovendo lançamentos e adequando nossa oferta a partir da regularização da curva de demanda”, comenta a empresa em sua divulgação de resultados.

Esse reaquecimento das operações na Argentina não é notado apenas por empresas brasileiras. Com sede na Holanda, a Stellantis, que reúne marcas como Fiat, Citroën e Peugeot, tem verificado um crescimento do volume de vendas no país desde o segundo semestre de 2024, movimento consolidado nos primeiros meses de 2025, conta Fernando Scatena, vice-presidente sênior de finanças para a América do Sul do grupo, ao Valor. O executivo atribui essa recuperação a um ambiente de maior estabilidade macroeconômica.

“Esse cenário tem gerado maior previsibilidade, ampliado o acesso ao crédito para os consumidores e favorecido um ambiente mais propício à oferta de veículos. Esses fatores, em conjunto, têm impulsionado as vendas e contribuído para a retomada sustentável do setor automotivo no país”, afirma.

Em setembro, a Stellantis anunciou um aporte de US$ 385 milhões (cerca de R$ 2 bilhões) no seu polo automotivo em Córdoba. Parte será destinada a transformar a unidade em um centro para a produção de picapes.

Outra medida econômica que deve impulsionar as operações argentinas é o acordo que o governo de Javier Milei assegurou com o Fundo Monetário Internacional (FMI) de US$ 20 bilhões, acrescenta Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.

Ele conta que as empresas passaram 2024 explicando os números negativos no país, mas que a situação não é mais essa. A Natura, por exemplo, somou R$ 526,8 milhões de receita argentina no primeiro trimestre de 2024, valor 59,1% inferior ao de igual período deste ano, de R$ 838,6 milhões.

*Estagiária sob supervisão de Nelson Rocco

[Fonte Original]

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