Em sessão plenária, o TRF-1 suspendeu uma decisão da Corte de outubro que havia derrubado a liminar que suspendeu a obra. Na documento do ano passado, o desembargador Flávio Jardim afirma que o trecho “trata-se de uma verdadeira estrada de barro, que permanece em atividade e que demanda urgente revitalização, sob pena de manutenção do isolamento das populações que vivem nas regiões interligadas pela rodovia e dos gastos com medidas paliativas de não agravamento”.
Em julho de 2024, a juíza Maria Elisa Andrade suspendeu a licença prévia. A magistrada tinha aceitado a ação civil pública movida pelo Observatório do Clima, rede que reúne dezenas organizações da sociedade civil. O grupo pedia a anulação da licença concedida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no último ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Advogado da coalizão, Paulo Busse afirmou ao GLOBO que o Observatório do Clima acredita que o governo Lula continuará entrando com recursos na Justiça para derrubar a decisão mais recente.
— A União, o Ibama e o Dnit agravaram à Justiça buscando restabelecer a Licença Prévia, e o Observatório também agravou buscando manter a suspensão da LP obtida em primeira instância. O Ministério Público Federal apoia a posição do Observatório do Clima, mas acreditamos que a maior parte do governo continuará entrando com recursos buscando reativar a LP e prosseguir com o processo de licenciamento de pavimentação da estrada. A maior parte da gestão Lula, inclusive o presidente, tem se mostrado favorável ao prosseguimento da obra. O Ministério do Meio Ambiente, por outro lado, tem manifestado preocupações — avalia Busse.
Em junho deste ano, o Ministério do Transportes disse ao GLOBO que prevê avanço no processo de licenciamento da via no segundo semestre deste ano. Defendida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e criticada por Marina, a obra preocupa ambientalistas, que alertam sobre os riscos de crescimento do desmatamento no coração da Floresta Amazônica. A discussão no Senado ocorreu menos de uma semana após a Casa aprovar um projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental, criticado pela ministra, que busca derrubá-lo na Câmara.
Uma licença prévia, com validade de cinco anos, foi aprovada pelo Ibama em julho de 2022, último ano de Bolsonaro no Planalto. Ela consiste em uma etapa de discussão sobre a localização do projeto e sua viabilidade ambiental, não permitindo a efetiva execução das obras de pavimentação. O próximo passo no processo seria a concessão de uma licença de instalação, que autorizaria o exercício da atividade, ante as medidas de controle ambiental e condicionantes.
A pavimentação do meio da rodovia é apoiada pelo governo do estado e por parlamentares, mas preocupa pesquisadores da área ambiental, pelos elevados impactos que o asfaltamento pode causar em uma das regiões mais bem preservadas do bioma amazônico — que compreende 13 municípios, 42 Unidades de Conservação e 69 Terras Indígenas.
O governador Wilson Lima defende a obra como “forma de tirar o estado do isolamento em relação ao restante do Brasil”. Lima aponta que a pavimentação permitirá a elaboração de uma rota alternativa de transporte de mercadorias em fases de seca.
— Não dá para querer construir uma imagem de protetor da floresta, deixando a população de Manaus de joelhos. A BR-319 tem como principal importância o desenvolvimento social, a integração com os outros estados. O que tem sido feito é uma covardia com o povo — diz o governador. — Não entra na minha cabeça o discurso de que não se deve pavimentar por não haver como controlar. Como o governo federal não consegue monitorar uma rodovia na Amazônia?
Pesquisador das universidades de São Paulo (USP) e Federal do Amazonas (Ufam), Lucas Ferrante rebate:
— A pavimentação da BR-319 atravessaria uma das regiões mais biodiversas do planeta, ampliando o desmatamento, a grilagem e a invasão de territórios indígenas, o que traria impactos diretos no clima e riscos à saúde pública global, devido à possibilidade de liberação de patógenos desconhecidos — aponta o pesquisador. — Responsabilizar a ministra Marina Silva por uma crise deliberadamente construída para fins políticos é desonesto. O futuro da Amazônia exige ciência e responsabilidade, não manipulação.