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segunda-feira, julho 7, 2025

Declaração final do Brics faz defesa do multilateralismo, mas adota tom mais ameno sobre guerras e tarifaço de Trump

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Em uma cúpula marcada pelo complexo cenário internacional, e também por duas ausências de peso no Rio de Janeiro, os líderes do Brics fizeram, na declaração final do encontro, uma firme defesa do multilateralismo, no momento em que instituições como a ONU estão sob intensa pressão. O texto traz condenações a guerras e ao uso de medidas como sanções e tarifas como ferramentas políticas, mas com um tom bem mais ameno e sem mencionar os EUA.

Os países expressam “preocupação com os conflitos em curso em diversas partes do mundo e com o atual estado de polarização e fragmentação da ordem internacional” e defendem uma “abordagem multilateral que respeite as diversas perspectivas e posições nacionais sobre questões globais cruciais”. Na reunião do Rio estavam ausentes os presidentes da China, Xi Jinping, e da Rússia, Vladimir Putin, que participou por videoconferência.

“Conclamamos a comunidade internacional a responder a esses desafios e às ameaças à segurança associadas por meio de medidas político-diplomáticas para reduzir o potencial de conflitos e enfatizamos a necessidade de engajamento em esforços de prevenção de conflitos, inclusive por meio do enfrentamento de suas causas profundas”, diz o texto.

Há uma menção ao aumento dos gastos militares, referência indireta ao recente anúncio da Otan, a principal aliança militar do Ocidente, que elevou o patamar desejado de gastos com Defesa no bloco para 5% do PIB, também citada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu discurso na manhã de domingo. Em um dos pontos de atrito dentro do bloco, a reforma do Conselho de Segurança, a declaração destaca a necessidade de uma reforma que inclua países em desenvolvimento, mas reconhecendo as “aspirações legítimas dos países africanos”.

Dentro do Brics, Brasil e Índia são as principais vozes em defesa da expansão do Conselho de Segurança. Por outro lado, a África do Sul aponta seu compromisso junto aos demais países africanos, através do Consenso de Ezulwini, de 2005, que estabeleceu que o continente deve ter ao menos dois assentos permanentes e cinco não permanentes no Conselho, definidos no âmbito da União Africana. A saída no comunicado foi adotar uma linguagem mais branda, sem compromissos abrangentes.

O comunicado condena os ataques de Israel ao Irã, em junho passado, que deram início a um conflito aéreo entre os dois países que durou quase duas semanas, reiterando a preocupação com as ações contra “instalações nucleares pacíficas”, mas sem mencionar o governo israelense — segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, Teerã queria termos mais duros, mas essa foi uma demanda contornada pelos negociadores — ou os EUA, que bombardearam instalações nucleares iranianas.

“Neste contexto, reiteramos nosso apoio às iniciativas diplomáticas destinadas a enfrentar os desafios regionais. Exortamos o Conselho de Segurança das Nações Unidas a se ocupar desta questão”, diz o texto.

Ao falar sobre outra crise, que permeia a História recente do Oriente Médio, as nações do bloco expressam “profunda preocupação” com a retomada dos ataques israelenses na Faixa de Gaza, citando Israel e condenando “ todas as violações do DIH (Direito Internacional Humanitário), inclusive o uso da fome como método de guerra”.

“Exortamos as partes a se engajarem, de boa-fé, em novas negociações com vistas à obtenção de um cessar-fogo imediato, permanente e incondicional; à retirada completa das forças israelenses da Faixa de Gaza e de todas as demais partes do Território Palestino Ocupado; à libertação de todos os reféns e detidos em violação ao direito internacional; e ao acesso e entrega sustentados e desimpedidos da ajuda humanitária”, afirma o texto.

Mais cedo, Lula havia chamado a situação no enclave de “genocídio”, mas o termo não aparece no texto final: alguns dos países do Brics participam das negociações sobre o fim da guerra, como o Egito, e têm planos para normalizar seus laços com Israel, como a Arábia Saudita. Seguindo uma posição antiga do Brics, as nações defenderam a solução de Dois Estados, um israelense e um palestino, “dentro das fronteiras internacionalmente reconhecidas de 1967”, além do acesso da Palestina à ONU.

A guerra na Ucrânia é tratada de forma tímida, com a defesa de iniciativas não ocidentais, em especial a liderada por Brasil e China, que não encontra uma boa recepção na Europa e em Kiev — como na última cúpula do Brics, em Kazan, não há uma condenação às ações russas em solo ucraniano, mas há referência a ataques contra as regiões russas de Bryansk, Kursk e Voronej, embora sem apontar que tenham sido ações dos ucranianos.

Apesar de o Brics incluir três potências nucleares — Índia, Rússia e China — a declaração final expressa a preocupação “com os crescentes riscos de perigo e conflito nuclear” e defende o estabelecimento de novas zonas livres de armas atômicas, especificamente no Oriente Médio. O texto não cita Israel, que tem suas próprias ogivas, ou o Irã, membro do grupo e acusado de tentar militarizar o programa nuclear, algo que Teerã nega.

Na parte dedicada à economia, o comunicado cita o Novo Banco de Desenvolvimento, chamado informalmente de “Banco do Brics”, “como um agente robusto e estratégico de desenvolvimento e modernização no Sul Global” e destaca as discussões sobre um novo sistema de pagamentos internacional. Mas, como esperado, o texto não apresenta espaço para a criação de uma moeda única do Brics, tampouco passos concretos para o abandono do dólar no comércio internacional. Em janeiro, o presidente dos EUA, Donald Trump, disse que aplicaria tarifas de 100% sobre os países do bloco caso avançassem com a ideia.

Por sinal, havia expectativa sobre a posição em relação à guerra tarifária dos EUA, assim como a imposição de sanções contra membros do Brics — Rússia e China. A declaração, embora condene a “imposição de medidas coercitivas unilaterais contrárias ao direito internacional” e cite suas “implicações negativas”, não aponta para a Casa Branca e seu tarifaço, no momento em que a maior parte dos países tenta negociar novos termos com Washington ou ao menos adiar ao máximo as medidas contra suas importações. Sobre a política de sanções, o texto diz que os membros do grupo “não impõem nem apoiam sanções não autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU”.

A declaração menciona o crescente uso da inteligência artificial (IA), em praticamente todos os campos de conhecimento, e faz uma defesa do respeito aos direitos de propriedade intelectual utilizados no ambiente digital, inclusive para fins de treinamento em inteligência artificial, bem como na remuneração justa aos titulares de direitos, respeitando as necessidades e prioridades dos países em desenvolvimento.

“Com o aumento da aplicação da IA, reconhecemos os riscos relacionados à apropriação indevida e à deturpação de conhecimento, patrimônio e valores culturais que são insuficientemente representados em conjuntos de dados e modelos de IA”, diz o texto, “entrando” em uma disputa que já opõe as Big Techs à sociedade civil e governos.

Ainda no contexto do multilateralismo, o Brics defende a ação conjunta contra as mudanças climáticas, com ênfase na necessidade de medidas de financiamento a países pobres, além do incentivo para o controle de emissões de gases do efeito estufa e transição energética — mas em uma concessão aos produtores de gás e petróleo, o texto reconhece “que os combustíveis fósseis ainda têm papel importante na matriz energética mundial, particularmente para mercados emergentes e economias em desenvolvimento”

“Afirmamos que a cooperação dentro e por meio do Brics é fundamental para contribuir com o esforço global em direção a um futuro sustentável e a transições justas e equitativas para todos”, diz a declaração.

[Fonte Original]

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