Criador do conceito de “limites planetários” e um dos maiores cientistas climáticos do mundo, o sueco Johan Rockström tem apostado na COP30, em Belém, como um momento estratégico de transição das negociações sobre clima que foram feitas até hoje para, de fato, a implementação de soluções sustentáveis. Para ele, o crescimento econômico mundial vai depender das ações que serão debatidas na conferência.
Segundo Rockström, a economia global já está sentindo as consequências da falta de cuidado com a natureza, com sociedades cada vez menos capazes de absorver os impactos de eventos, como calor extremo, desmatamento e da poluição dos oceanos.
“A solução principal é a descarbonização, mas a natureza tem mostrado sinais de perda de capacidade de absorver carbono”, destacou. “Temos soluções para descarbonizar todos os setores econômicos. E esse é o desafio”, frisou Rockström, durante o Encontro Futuro Vivo, que aconteceu nesta terça-feira (26), em São Paulo, organizado pela Vivo.
E a corrida para alcançar esse objetivo segue acelerada, segundo o pesquisador sueco. “Nós podemos emitir apenas 200 GtCO2, que significa gigatonelada de dióxido de carbono. Esse é o valor limite, antes de esgotar o Orçamento de Carbono remanescente”, afirmou.
A descarbonização segue ligada intrinsicamente com as mudanças do clima. De acordo com o cientista sueco, o acúmulo de desafios não sanados terão consequências graves para a economia global. Na próxima década, os perigos das variações climáticas podem gerar perdas anuais de US$ 560 bilhões a US$ 610 bilhões para empresas e o calor extremo será a principal causa.
“Negócios que falharem em se adaptar a riscos climáticos como calor extremo podem perder até 7% dos ganhos anuais até 2035”, observou. Por isso, a emergência de implementar soluções, acelerando em economias emergentes, definição que inclui o Brasil.
Para ele, iniciativas sustentáveis vêm apresentando melhores resultados em países emergentes, como Brasil e África. O cientista também disse acreditar no Brasil como liderança de sustentabilidade nesse processo e destacou que a articulação da COP30, em novembro, fará de Belém um ponto de virada das últimas conferências climáticas.
Rockström, que criou o conceito de limites planetários, define as nove fronteiras biofísicas que regulam a estabilidade da Terra – entre elas, o clima, a biodiversidade, os ciclos de água doce e de nutrientes, o uso da terra e a integridade dos oceanos. O alerta do pesquisador é que ultrapassar esses limites aumenta drasticamente o risco de desestabilizar os sistemas naturais que sustentam a vida humana.
Entre essas fronteiras, o cientista destaca os chamados pontos de não retorno (tipping points), quando as alterações ambientais atingem um patamar irreversível. A Amazônia, por exemplo, pode chegar a um ponto em que a perda de floresta (estimada entre 20% e 25% da cobertura original) desencadeie um processo de savanização. A floresta deixaria de gerar a umidade que mantém seu próprio ciclo de chuvas, colapsando sua biodiversidade e sua capacidade de regular o clima da América do Sul, impactando sua biodiversidade.
Na percepção do climatologista brasileiro Carlos Nobre, as soluções sustentáveis já são possíveis de implementar e, agora, fazem parte da preocupação dos brasileiros. Para começar, ele listou ao Valor a substituição dos combustíveis fósseis e a adesão às energias renováveis, como a solar, como uma prática factível.
Nobre acrescentou que nesta toada do Brasil à frente da transição energética – e tentando uma mitigação climática -, a COP30 se faz mais relevante. “O evento precisa ser o mais importante de todas as conferências anteriores”. A Conferência precisa ser capaz de firmar compromissos únicos e efetivos para evitar que a temperatura global ultrapasse os 2ºC, disse Nobre.
“O Brasil sofre muito com a emergência climática. Se a temperatura do planeta passar de 2 graus, nós vamos passar do ponto de retorno da Amazônia e vamos perder quase toda a floresta. Nós somos um país que tem tudo a ver com isso, ao passo que temos a maior biodiversidade do mundo. Se perdermos a Amazônia, perderemos milhões de espécies [para a bioeconomia]”, afirmou.
De acordo com Nobre, o ponto de não retorno da Amazônia, além de jogar uma “gigantesca quantidade de gás carbônico na atmosfera, degradando a floresta – mais de 250 bilhões de toneladas de CO2 até o final do século -, vai ter um enorme risco que é as epidemias. “A perturbação da floresta tropical está criando um monte de vírus que viram epidemias, as zoonoses”, salientou.
Apesar da gravidade da crise, Rockström afirmou ver sinais encorajadores. “É um momento de urgência, mas também de esperança. Temos cada vez mais evidências de que a jornada sustentável pode gerar segurança, saúde e prosperidade no futuro. A narrativa está mais madura. Estou inspirado porque o ‘elefante branco na sala’ – a inação – começa finalmente a dar lugar à ação.”
Nobre também se mostrou otimista, porque a preocupação climática deixou de ser um aposto exclusivo do consenso científico. “O que aconteceu no Rio Grande do Sul no ano passado foi um ponto de virada para os brasileiros: estamos finalmente em busca de soluções baseadas na natureza. Tenho esperança na nova geração, em especial nas mulheres, para liderar o caminho de salvar o planeta”, destacou.
Ele defende que a corrida brasileira, em conjunto com a indústria, deve ser para dar escala à bioeconomia amazônica, transformando a biodiversidade em vetor de desenvolvimento e em alternativa concreta ao desmatamento. Nobre enfatizou que a perda da biodiversidade amazônica afeta diretamente a estabilidade climática global.
“Como combater todos os pontos emergenciais do clima? Com soluções da natureza. Estamos trabalhando duro para trazer luz à potência da economia gerada pela biodiversidade”, afirmou durante o evento.
Já a Vivo se comprometeu a restaurar e proteger 800 hectares de floresta amazônica até 2055. Nos próximos 30 anos, a companhia prevê o plantio, regeneração e conservação de mais de 900 mil árvores de 30 espécies nativas a fim de criar habitats em zonas endêmicas da Amazônia.
“Restaurar a biodiversidade na Amazônia é um compromisso que assumimos com a maior floresta tropical do mundo e com as próximas gerações”, destacou Christian Gebara, CEO da Vivo.
O projeto será localizado próximo a um dos últimos grandes blocos de floresta densa, em uma das regiões mais desmatadas, com o objetivo de promover a conservação de espécies ameaçadas, como o macaco-caiarara e contribuir para a conexão de fragmentos florestais. Em paralelo, a ação pretende auxiliar no manejo de sementes, frutos e seivas, e promovendo renda de cadeias produtivas sem desmatamento.
“O processo será conduzido com consulta ativa a comunidades tradicionais, assentamentos e povos originários num raio de até 20 km do projeto, valorizando seus saberes e fortalecendo sua relação com o território”, informou a Vivo, que deseja fortalecer a atuação da empresa na COP30.