Em 11 de agosto de 2020, a empresa de software então chamada MicroStrategy, deu um passo que mudaria a sua história: comprou Bitcoin pela primeira vez.
Cinco anos depois, agora rebatizada como Strategy, a empresa se tornou referência no mercado, acumulando a maior posição corporativa de BTC do mundo e liderando o movimento das Bitcoin Treasuries Companies.
Tudo começou em 2020, durante um dos períodos mais conturbados da história recente: a pandemia de Covid-19.
Além da crise de saúde, os lockdowns provocaram impactos profundos na economia global, levando a uma retração de 5,2% no PIB mundial, segundo o Banco Mundial.
Para conter os efeitos da crise, governos e bancos centrais adotaram medidas de estímulo sem precedentes, como:
- Queda das taxas de juros;
- Aumento da dívida pública;
- Expansão da base monetária a níveis recordes.
Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, o M2 (indicador da oferta monetária de um país) do Federal Reserve saltou de US$ 15,4 trilhões em fevereiro de 2020 para US$ 17,8 trilhões em maio — um aumento de US$ 2,4 trilhões em apenas quatro meses. Em termos de comparação, durante a crise do subprime (2007–2009), período inclusive, em que o Bitcoin foi criado, a expansão foi de “apenas” US$ 1 trilhão em 18 meses.
E essas medidas teriam um custo: inflação.
Diante desse cenário, Michael Saylor, o presidente da Strategy, liderou a digitalização da companhia e um corte agressivo de despesas, economizando US$ 5 milhões em um primeiro momento. Mas surgiu um novo desafio: como preservar esse capital diante de um dólar que, nas palavras dele, era “um cubo de gelo derretendo” devido à expansão monetária?
O conselho avaliou diversas opções: ações, títulos de dívida, imóveis, commodities e até metais preciosos, como o ouro. Tudo mudou quando Saylor aprofundou suas pesquisas sobre Bitcoin, influenciado também pelo livro O Padrão Bitcoin, de Saifedean Ammous (na edição mais recente do livro, Saylor escreve o prefácio mencionando como o livro foi um divisor de águas para a estratégia).
Além do potencial de valorização, o Bitcoin oferecia qualidades que Saylor considerava cruciais: oferta limitada, descentralização e previsibilidade. Com o apoio do conselho, a empresa anunciou em agosto de 2020 a primeira compra de 21.454 BTC, por US$ 250 milhões, a um preço médio de US$ 11.863.
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De proteção de tesouraria a identidade corporativa
Após a primeira compra, a Strategy não parou mais e cinco anos depois, o que começou como uma estratégia para proteger o caixa, se tornou o coração do modelo de negócios da Strategy. Até agora, já foram mais de 60 compras e 628.946 BTC acumulados (com valor de mercado de US$ 74.7 bilhões).
No início, as compras eram feitas somente com o caixa da empresa, mas prevendo uma valorização exponencial do ativo, Saylor passou a utilizar outras estratégias para adquirir BTCs, como:
- Emissão de dívidas (Debt Issuance)
Para seguir acumulando Bitcoin, a MicroStrategy passou a captar recursos no mercado emitindo notas conversíveis (convertible senior notes) e, em alguns casos, debêntures garantidas (secured notes). Na prática, isso significa que a empresa pega dinheiro emprestado de investidores, com a promessa de pagar com juros no futuro. O capital levantado é direcionado exclusivamente para a compra de Bitcoin.
- Venda de ações (Equity Offering)
Outra estratégia foi emitir novas ações da própria empresa por meio de operações conhecidas como “at-the-market offerings” (ATM offerings). Com essa estrutura, a empresa pode vender ações diretamente no mercado conforme as condições forem favoráveis, usando os recursos arrecadados para comprar mais Bitcoin, o que Saylor apelidou como “Bitcoin yield”.
Todas essas aquisições foram majoritariamente feitas durante o período de 2021 a 2023, com foco no longo prazo.
As compras são realizadas através de negociações de balcão (OTC), evitando grandes variações de preço e depois transferidos para as carteiras digitais geridas pela empresa.
Com essa estratégia, a Strategy passou a ser conhecida dentro do mercado como uma forma de exposição indireta ao Bitcoin. Antes mesmo da aprovação dos ETFs pela SEC, em janeiro de 2024, muitos investidores — inclusive institucionais — usavam as ações da empresa (ticker MSTR) como um “ETF de Bitcoin não oficial”.
Hoje, a ação da Strategy é considerada uma proxy de Bitcoin alavancada, ou seja, uma ação que tem correlação com o preço de outro ativo, mas com um grau maior de amplitude nos ganhos (e nas perdas).
Foi dessa forma que as ações da Strategy subiram neste período de cinco anos em +2.595%! Mais inclusive que o próprio Bitcoin, que valorizou no mesmo período 905%, segundo cotações do Yahoo Finance e CoinGecko.
E com essa reputação próxima ao Bitcoin, em fevereiro deste ano a companhia deu um novo passo: o rebranding da marca, passando a adotar o nome de Strategy com um B estilizado.
Liderando um movimento
Quando a Strategy anunciou ao mercado que o Bitcoin passaria a ser o principal ativo de sua tesouraria, causou certo ceticismo entre agentes do mercado, especialmente durante o bear market de 2022 e 2023. Ainda assim, Michael Saylor manteve a convicção e intensificou as compras nesse período, reforçando a imagem da empresa como a maior defensora corporativa do ativo.
A postura resiliente e a narrativa de Saylor que foi construída em entrevistas, conferências e em suas redes sociais, foi fundamental para tornar a Strategy em um case de referência para executivos e investidores. Já que, para muitos, ver uma companhia listada na Nasdaq assumir publicamente o Bitcoin como o centro de sua estratégia, ajudou a desmistificar a percepção de risco e validar a tese de que o ativo poderia servir como reserva de valor corporativa.
Depois disso, não demorou para que outras empresas, de diferentes setores e tamanhos, adotassem estratégias semelhantes na busca por preservação do poder de compra e diversificação. Entre elas estão Metaplanet, Trump Media, Semler Scientific, SpaceX, Tesla, Mercado Livre e, mais recentemente, a Méliuz, que é a primeira a replicar o movimento no Brasil.
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Até agora, cerca de 220 empresas de capital aberto ou fechado possuem mais de 1.2 milhão de BTC somados, o equivalente a quase 6% de toda a oferta disponível do ativo.
A Strategy foi pioneira na adoção do Bitcoin como reserva corporativa, saindo do completo anonimato do mercado cripto para se tornar um modelo a ser seguido. Apesar de ter sido visto como um movimento arriscado, a estratégia não só redefiniu a identidade da empresa como deu um pontapé para um movimento global de adoção corporativa.
As empresas entenderam que ativos digitais não são excludentes, mas aliados na diversificação.
Possivelmente, daqui alguns anos, esse período será lembrado como o momento em que as tesourarias começaram a se tornar digitais.
E uma última pergunta ao leitor: Atualmente, já celebramos o Bitcoin Pizza Day, relembrando a primeira compra registrada usando o ativo.
No futuro, será que o dia 11 de agosto entrará para o calendário como o “Bitcoin Strategy Day”, o dia que marca o início da adoção corporativa de Bitcoin?
Sobre o autor
André Ferreira é economista de formação e atua como analista comercial no time de Relacionamento Trader do MB – Mercado Bitcoin. Iniciou sua atuação no mercado cripto desde 2019, também no MB e tem conhecimento em blockchain, ativos digitais, trading de cripto e OTC.
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