Dos US$ 368 bilhões de perdas econômicas globais decorrentes de desastres naturais registrados em 2024, apenas 40% estavam segurados. No Brasil, no mesmo período, foram computados 1.690 eventos do tipo, mais de quatro por dia. Não há mais dúvidas a respeito do impacto das mudanças climáticas sobre a vida em sociedade, nem da importância do setor de seguros para contribuir com a mitigação dos danos e com soluções capazes de proteger o país. Mas há espaço para ampliar a cobertura e desenvolver novos produtos adequados ao momento atual.
É com esse objetivo que a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) vem atuando com soluções que promovem a resiliência e a estabilidade diante de um cenário marcado pelas incertezas. O setor financia 26% da dívida pública nacional, com ativos financeiros da ordem de R$ 2,3 trilhões e arrecadação equivalente a 6,2% do Produto Interno Bruto (PIB).
Em um ano em que o papel de liderança do Brasil nas pautas relacionadas à responsabilidade climática, ambiental e social se fortalece com a realização da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP30, em Belém, a confederação apresenta suas propostas de forma concreta na Casa do Seguro, que funcionará durante todo o evento, de 10 a 21 de novembro, na capital paraense.
A poucos metros da entrada principal da COP30, a Casa do Seguro terá 1.600 metros quadrados, recebendo debates e fóruns multissetoriais, reuniões bilaterais, demonstração de produtos e serviços e apresentações culturais. Representantes dos setores público e privado e do terceiro setor discutirão lá os impactos das mudanças climáticas na indústria, na infraestrutura, no dia a dia do cidadão, no cooperativismo, na longevidade e no agronegócio. Esse projeto se viabilizou com a parceria de nove seguradoras que atuarão como empoderadoras — Allianz, AXA, BB Seguros, Bradesco Seguros, MAPFRE, Marsh McLennan, Porto, Prudential e Tokio Marine.
O ex-ministro do Planejamento Dyogo Oliveira, diretor-presidente da CNseg, vê a Casa do Seguro como uma representação concreta do engajamento do setor na questão. “A sustentabilidade está presente na agenda da indústria global de seguros, que olha com atenção crescente para as mudanças climáticas. Avaliamos riscos, o que nos leva a atender às necessidades da sociedade e a identificar oportunidades de mercado. A COP representa um momento de convergência de debates sobre o tema, nos setores público e privado”, afirma.
O físico Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e membro da Academia Brasileira de Ciências, estará entre os especialistas que participarão dos debates na Casa do Seguro. Ele ressalta a urgência da discussão. “A estrutura econômica atual não é sustentável. Precisamos construir uma nova base, e o faremos por vontade própria ou pressionados pelo impacto da mudança climática”, diz.
Artaxo aponta ainda que as empresas agora precisam colocar a análise de riscos no centro de suas estratégias. “Os modelos desenvolvidos pela ciência apoiam a tomada de decisões, mas há muito a ser feito para atuar na redução dos danos e na prevenção dos futuros impactos. E a indústria de seguros pode apoiar essa tomada de decisões, que não é simples.”
Aloísio Melo, secretário nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), aponta que a COP vai marcar um ano da entrega da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) brasileira, que prevê as metas de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) até 2035. “Nosso desafio expresso na NDC é zerar o desmatamento ilegal até 2030 e ser um país neutro em carbono até 2050”, descreve.
A forma de implementação dessas metas, de redução entre 59% e 67% nas emissões líquidas, estará expressa no Plano Clima, que vem sendo elaborado pelo governo brasileiro desde 2023 e está em fase final de consolidação. Nesse sentido, o papel das seguradoras pode ser positivo, ele aponta. “Sabemos que existe uma grande lacuna no Brasil, em função das desigualdades, tanto de renda quanto de distribuição dos espaços urbanos, que impede a popularização do seguro patrimonial. O papel do Estado é importante, mas insuficiente para recompor modos de vida ou para repor perdas. Dados da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susep) apontam que 90% das perdas causadas por danos naturais no Brasil não estão cobertas por seguro.”
A CNseg vai compartilhar na Casa do Seguro, em Belém, em novembro, sete propostas do setor securitário para a questão climática, dando sua contribuição às discussões da COP30. Elas também serão discutidas em um evento pré-COP30 realizado em Brasília, no dia 8 de outubro, a partir das 14 horas, no Hotel Royal Tulip.
Contando com autoridades governamentais, parlamentares, lideranças setoriais, executivos de sustentabilidade e representantes do terceiro setor, o evento preparatório em Brasília antecipará os temas principais da programação da Casa do Seguro durante a COP30. Na ocasião, ainda será discutido o papel do setor de seguros no desenvolvimento da infraestrutura brasileira, no agronegócio, na proteção social, em investimentos, assim como a contribuição que o segmento pode dar para aceleramento da agenda de finanças sustentáveis no Brasil.
Veja a seguir o resumo das propostas:
1. Seguro social catástrofe
Está em discussão em diversos segmentos da sociedade e poderia viabilizar amparo financeiro para vítimas de desastres provocados por inundações, alagamentos ou desmoronamentos. Sua adoção depende de aprovação de uma lei específica — existem diferentes projetos em tramitação no Congresso Nacional que apontam nessa direção.
2. Green bonds e investimentos sustentáveis
Em vista do sucesso de duas emissões recentes de títulos soberanos sustentáveis no exterior, o setor propõe ampliar essa estratégia, por meio da emissão de novos green bonds, agora no mercado doméstico, que podem representar uma alternativa estratégica para conectar a capacidade de investimento do setor com a necessidade de financiamento da agenda sustentável do país.
3. Proteção de investimentos em infraestrutura
O seguro é um instrumento fundamental para o cumprimento das obrigações contratuais. O setor trabalha para que essa ferramenta seja amplamente incorporada aos projetos de infraestrutura, em novas frentes, para além da Lei de Licitações, que já representou um passo importante nessa direção, mas pode alcançar novos aspectos, inclusive a mitigação de riscos.
4. Seguro rural e fundo rural
O campo vem sendo afetado pelas alterações no clima, e ainda assim, atualmente, apenas 7,7% da área agrícola cultivada do país conta com cobertura de seguro rural. Esse cenário pode ser alterado pela modernização do Fundo de Seguro Rural, um instrumento de estabilização capaz de absorver os choques causados por perdas não previstas.
5. Hub de riscos climáticos
A proposta desse espaço de estudos é aproximar o setor de seguros da ciência climática, com informações regionalizadas e atualizadas a respeito dos impactos dos eventos climáticos. A proposta do setor é lançar uma plataforma integrada, à qual seriam adicionadas informações das seguradoras a respeito do impacto de eventos climáticos extremos, como sinistros e perdas.
6. Taxonomia sustentável brasileira
A construção dessa estratégia, que pretende integrar o Comitê Consultivo Interministerial liderado pelo Ministério da Fazenda, é fundamental para o setor, já que considera o potencial das empresas de seguro em investir no desenvolvimento sustentável do país. É uma forma de o seguro ser reconhecido em seu papel de salvaguarda para a classificação sustentável de projetos.
7. Soluções baseadas na natureza
Capazes de contribuir com até 37% da mitigação necessária de emissões, e assim manter o aquecimento global abaixo dos 2oC, essas iniciativas podem impulsionar a economia, mantendo a floresta em pé. O setor de seguros apoia essas ações, com iniciativas que visam fortalecer a resiliência ambiental, valorizar o capital natural e garantir a sustentabilidade no longo prazo.