Crédito, Getty Images
- Author, Mike Wendling e Shayan Sardarizadeh
- Role, BBC News
“Já estou farto do ódio dele”, respondeu Tyler Robinson, em uma mensagem de texto. “Há ódios que não se negociam.”
Na terça-feira (16/9), as autoridades divulgaram mensagens trocadas entre Robinson e a colega de quarto horas após o tiroteio. As autoridades disseram que a colega de quarto, não identificada, era uma pessoa trans, em transição para mulher e mantinha um relacionamento amoroso com o réu.
Os promotores também deram detalhes que podem apontar para um possível motivo – embora ainda haja muito que não se saiba.
De acordo com a acusação, a mãe de Robinson disse à polícia que, ao longo do último ano, Robinson se tornou mais político e de esquerda, “mais pró-gays e direitos trans”, nas palavras dela.
E em conversas familiares antes do tiroteio, Robinson teria acusado Kirk de disseminar ódio.
Os promotores dizem que Robinson deixou uma mensagem para sua colega de quarto: “Tive a oportunidade de matar Charlie Kirk e vou aproveitá-la.”
Durante a coletiva de imprensa de terça-feira, o promotor do Condado de Utah, Jeff Gray, disse que, em vez de apagar as mensagens, como Robinson pediu, a colega de quarto as entregou à polícia.
Mensagens em cápsulas de balas
As mensagens e entrevistas com familiares constituem partes cruciais da acusação contra Robinson e dão uma ideia de seu estado de espírito.
Além disso, os investigadores também disseram que quatro cápsulas foram encontradas ao lado de um rifle descoberto em uma área arborizada perto do campus da Universidade Utah Valley.
As cápsulas continham mensagens gravadas que, antes da prisão de Robinson, estavam entre as únicas pistas possíveis sobre o motivo do assassino – e têm sido objeto de muita especulação.
Uma bala não disparada continha as palavras “Ei, fascista! Pega!”, juntamente com setas para cima, para a direita e três para baixo – provavelmente uma referência a um videogame, Helldivers 2, indicando um dos movimentos especiais do jogo.
Outra cápsula, segundo as autoridades, dizia “NoTices Bulge OWO What’s This?” (“Percebe o volume… o que é isso?”, em tradução livre) — uma referência a um meme sobre a subcultura furry, que reúne pessoas interessadas em animais antropomórficos, e RPG online.
A BBC também viu um perfil online supostamente pertencente a Robinson em um site dedicado à subcultura furry, sugerindo que ele pode ter se interessado pelo assunto.
Outra cápsula continha uma inscrição com a letra da música Bella Ciao, que homenageia os guerrilheiros da resistência italiana da Segunda Guerra Mundial que lutaram contra a Alemanha nazista. A música também apareceu em um videogame, uma série de TV e foi regravada e remixada diversas vezes desde então.
O quarto cartucho dizia: “If you Read This, You Are GAY Lmao” (“Se você leu isso, você é GAY kkkkk”, em tradução livre) – outra referência vinda da internet.
Mas o significado exato das mensagens, se de fato pretendem ter algum significado além de uma brincadeira, ainda não está claro. A natureza da linguagem online, com suas camadas e camadas de ironia, significa que múltiplas interpretações são possíveis.
Nas mensagens para sua colega de quarto, Robinson disse que as gravuras eram “principalmente um grande meme”, indicando que talvez não devessem ser levadas a sério.
Imagens de contas em redes sociais aparentemente pertencentes a Robinson e sua colega de quarto, que têm circulado online, são principalmente focadas em jogos — parece que tanto Robinson quanto a colega de quarto eram ávidos por videogames.
As contas incluem alguns comentários esparsos sobre política, nenhum deles particularmente conclusivo ou diretamente indicativo de um motivo. A BBC analisou as contas, mas não conseguiu confirmar se pertencem à dupla.
De acordo com as mensagens divulgadas pelos promotores, quando questionado por sua colega de quarto quanto tempo havia levado para planejar o ataque, Robinson respondeu: “Um pouco mais de uma semana.”

Crédito, Getty Images
O que não se sabe?
Os promotores em Utah, em sua maioria, se recusaram a responder a perguntas da imprensa na terça-feira e, embora o governador do Estado, Spencer Cox, tenha dito que Robinson tinha uma “ideologia de esquerda”, ainda há lacunas no que sabemos sobre um possível motivo.
Por exemplo, não está claro o que especificamente Robinson considerou questionável em Kirk. Também não está claro como Robinson pode ter se radicalizado e qual o papel que suas atividades online podem ter tido nesse processo.
As autoridades têm mantido segredo sobre qual papel — se algum — a orientação política do suspeito desempenhou no ataque.
Quando Jeff Grey, o promotor do condado, foi questionado diretamente se o ativismo trans teria inspirado o tiroteio, ele se recusou a comentar.
Também permanece a possibilidade de que o suspeito não tenha tido uma posição política coerente. Em vários tiroteios em massa e tentativas de assassinato recentes nos EUA — incluindo a tentativa de assassinato de Donald Trump na Pensilvânia em julho passado — os assassinos pareciam ter um conjunto confuso de crenças políticas ou nenhuma ideologia claramente definida.
O FBI reconheceu recentemente uma nova categoria de ameaça chamada “extremismo violento niilista” ou NVE, na sigla em inglês, definida por uma hostilidade geral à sociedade e um desejo de caos, em vez de uma ideologia claramente definida.
O diretor do FBI, Kash Patel, disse em uma audiência no Senado na terça-feira que sua agência observa um grande aumento nos casos envolvendo NVE.
No caso de Kirk, Katherine Schweit, ex-agente do FBI e promotora, disse que os investigadores estarão ocupados rastreando as comunicações online de Robinson e suas interações com amigos e familiares para obter mais informações.
“Isso nos dá muitos insights sobre o caminho de alguém até a violência”, disse ela, acrescentando que os agentes “juntarão todas as peças para ver como alguém percorre o caminho da frustração até a escolha de cometer um ato violento”.
A perspectiva da pena de morte significa que os promotores precisarão demonstrar a intenção de cometer homicídio ao levarem seu caso ao tribunal. No entanto, Schweit diz que isso é diferente da motivação, que pode ou não ser diretamente relevante para o caso.
“A TV e o cinema nos ensinaram que o motivo é o mais importante, mas do ponto de vista da acusação, não é.”
Schweit também observou que alguns assassinos de grande notoriedade foram motivados pelo desejo de serem famosos ou impressionar as pessoas.

Crédito, Getty Images
Ativistas alimentam especulações
Durante a audiência no Senado na terça-feira, o diretor do FBI, Patel, também disse que outras pessoas estão sendo investigadas por possível envolvimento no tiroteio.
Até o momento, ninguém mais foi acusado em conexão com o caso e os investigadores não indicaram que alguém mais estivesse envolvido.
Isso não impediu fortes especulações online — em grande parte sem evidências — sobre supostos motivos e conspirações em larga escala.
Vários influenciadores de direita com grande número de seguidores nas redes sociais, incluindo vários próximos do presidente Trump e da organização Turning Point USA, fundada por Kirk, alegaram que o tiroteio foi obra de um grupo ou “célula terrorista” inspirado pelo ativismo trans e financiado por ativistas de esquerda.
Trump disse esta semana que designará o “antifa” — um movimento descentralizado de esquerda que se opõe a grupos de extrema direita, racistas e fascistas — como uma “grande organização terrorista” como parte de seus esforços para atingir a “esquerda radical”, após o assassinato de Kirk.
Robinson, o suspeito, não era diretamente ligado a grupos que se declaram “antifa”.
Alguns podcasters de direita de grande notoriedade, incluindo o ex-assessor chefe de Trump, Steve Bannon, sugeriram que as mensagens de texto trocadas por Robinson e sua colega de quarto eram de alguma forma falsas ou falseadas, sugerindo — novamente sem evidências — uma conspiração mais ampla.
Ao mesmo tempo, vários usuários de esquerda nas redes sociais continuaram a afirmar que Robinson é apoiador de Trump ou membro de um grupo marginal de extrema direita conhecido como “groypers” — que criticava Kirk constantemente por não apoiar suas convicções nacionalistas brancas e antissemitas.
Essas alegações também carecem de evidências, e promotores e autoridades de Utah não deram nenhuma indicação de que grupos de direita radical estejam envolvidos.
“Todo mundo está tirando conclusões precipitadas porque essa é a sociedade em que vivemos”, disse Schweit, o ex-agente do FBI. “Todo mundo quer uma resposta — e agora.”