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- Author, Mariana Alvim
- Role, Da BBC News Brasil em São Paulo
A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (17/09) a urgência para um projeto de anistia.
A urgência votada foi relativa a um projeto de lei de 2023, do deputado federal Marcelo Crivella (Republicanos-RJ). Entretanto, esse texto ainda deve mudar.
O projeto de lei de Crivella dá anistia a “participantes das manifestações reivindicatórias de motivação política ocorridas entre o dia 30 de outubro de 2022 e o dia de entrada em vigor” da possível lei.
Foram 311 votos a favor da urgência, 163 contra e 7 abstenções. A data de votação do projeto ainda será marcada.
Em entrevista exclusiva à BBC nesta quarta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que vetaria uma proposta de anistia. Projetos de lei precisam ser sancionados ou vetados pelo presidente, mas o Congresso também pode derrubar um eventual veto.
“Se viesse pra eu vetar, pode ficar certo de que eu vetaria. Pode ficar certo que eu vetaria”, disse o presidente.
Depois da declaração, ainda na entrevista, Lula tentou se distanciar do assunto e indicou que caberia ao Congresso, e não a ele, decidir sobre o assunto.
O texto de Crivella abarca pessoas que tenham participado de manifestações com “motivação política e/ou eleitoral” ou que tenham contribuído com “doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais”.
Ou seja, a princípio, a proposta incluiria pessoas punidas na Justiça por participarem dos ataques e invasões na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro de 2023.

Crédito, Bruno Spada/Câmara dos Deputados
Sendo assim, o teor do texto e por quem ele será conduzido na Câmara são incógnitas até o momento.
Motta vinha sendo pressionado nas últimas semanas para pautar o assunto ou, ao menos, sua urgência.
Esta acelera a tramitação de um projeto — fazendo com que ele possa ser votado diretamente no Plenário, sem passar por comissões, por exemplo.
“O Brasil precisa de pacificação e de um futuro construído em bases de diálogo e respeito. O país precisa andar. Temos na Casa visões distintas e interesses divergentes sobre os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023. Cabe ao Plenário, soberano, decidir”, disse Motta em suas redes sociais nesta quarta, justificando a decisão de colocar a urgência para votação.
Quanso apresentado, o projeto de Crivella, ex-prefeito do Rio, teve apoio de nomes de oposição ao governo Lula como Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do PL — o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro — na Câmara.
A princípio, o projeto de Crivella não é tão abrangente no perdão como alguns desejavam. Esse tipo de proposta vem sendo chamado de “anistia light“.
Mais uma vez, é importante lembrar que o texto de Crivella deve mudar a partir dessa quinta-feira, com a designação de um relator.
Uma pesquisa do Instituto Datafolha divulgada no último dia 13 mostrou que uma anistia a Bolsonaro é rejeitada por 54% dos brasileiros e apoiada por 39% da população.
Pedidos de anistia se tornaram frequentes em manifestações bolsonaristas, inclusive com o endosso do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Possível candidato à presidência em 2026, ele já afirmou que, se assumir o Planalto, a anistia a Bolsonaro seria seu “primeiro ato”.
Hugo Motta e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), já indicaram preferir uma proposta mais branda de anistia.
No STF, a expectativa é que a maioria da Corte derrubaria a anistia, caso esta seja aprovada no Congresso e consiga derrubar um eventual veto de Lula, tornando-se lei.
Ao menos seis ministros do STF já se manifestaram em votos ou falas públicas contra a possibilidade de um perdão para crimes contra a democracia: Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.
Fux, porém, vem mudando suas decisões relacionadas aos ataques antidemocráticos do 8 de janeiro e foi o único ministro da Primeira Turma do STF a votar pela absolvição de Bolsonaro.
Como governo Lula tem se posicionado

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Nas duas últimas semanas, enquanto ocorria o julgamento de Bolsonaro, a gestão Lula acelerou a distribuição de emendas parlamentares (recursos que deputados e senadores podem destinar para investimentos em suas bases eleitoras).
O valor liberado no período superou R$ 3 bilhões, gerando acusações da oposição.
“O governo corrupto e perverso está lançando mão das emendas parlamentares para tentar comprar votos contra a anistia. Cobre seu deputado, cobre seu senador e descubra se ele tem preço ou valor”, disse a deputada Bia Kicis (PL-DF) em um post na plataforma X, no sábado (13/7).
Em evento no mesmo dia, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, disse que o governo não pode “piscar para questão da anistia”. A fala foi noticiada pelo jornal Folha de S.Paulo.
“Não podemos de maneira nenhuma olhar ou piscar para a questão da anistia. Vamos ser firmes, vamos ter que enfrentar o Congresso nesta pauta”, afirmou a ministra, destacando ainda o perdão a Bolsonaro e outros condenados por tentativa de golpe seria “um presentinho para Donald Trump”.
Na ocasião, porém, ela voltou a se mostrar aberta à discussão sobre redução de penas relacionadas ao 8 de janeiro.
“Se querem discutir redução de pena, é outra coisa. Cabe a dosimetria ao Supremo Tribunal Federal ou até o Congresso avaliar e ter um projeto, mas aí é redução de pena, não tem a ver com anistia, não tem a ver com perdão”, disse.
A situação de Bolsonaro na Justiça tem motivado retaliações do governo dos Estados Unidos, comandado por Donald Trump.
Ao anunciar tarifas de 50% contra o Brasil em julho, o republicano justificou que o ex-presidente estaria sofrendo uma “caça às bruxas” no Brasil.
Na ocasião, Bolsonaro já era réu, mas ainda não havia sido condenado.
Depois, centenas de produtos brasileiros passaram a ser isentos da tarifa, mas vários outros itens relevantes para a agenda exportadora brasileira continuam taxados.
O ministro Alexandre de Moraes, relator no STF da ação penal de condenou Bolsonaro, foi sancionado no fim de julho com a Lei Magnitsky.
Esta foi criada nos EUA para punir estrangeiros considerados autores de graves violações de direitos humanos e práticas de corrupção.
*Com informações de Mariana Schreiber, da BBC News Brasil em Brasília