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- Author, Jessica Bradley
- Role, BBC Future
Medicamentos como o Ozempic permitiram que muitas pessoas perdessem peso que antes não conseguiam eliminar. Será que uma dieta poderia ter o mesmo efeito sem a necessidade de receita médica?
Nos últimos anos, a chegada de medicamentos para perda de peso – como Ozempic e Wegovy – virou de cabeça para baixo a forma como a medicina lida com a obesidade.
Essas drogas, conhecidas como agonistas do peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1 (GLP-1), ajudam pessoas com obesidade a perder peso ao reduzir o apetite, levando a uma menor ingestão de alimentos. No entanto, junto com a popularidade desses medicamentos, surgiram alegações de que seria possível imitar seus efeitos apenas por meio da alimentação.
Uma tendência nas redes sociais, por exemplo, sugere que uma mistura de aveia com água e suco de limão – apelidada de ‘oatzempic’ – poderia suprimir o apetite e provocar a perda de peso de forma semelhante aos remédios.
Mas será que alguma dieta, alimento ou bebida realmente se aproxima dos efeitos do Ozempic? A chamada “dieta oatzempic” pode funcionar?
O que são os medicamentos GLP-1 para perda de peso?
Os novos medicamentos de perda de peso imitam um processo natural que ocorre no nosso corpo todos os dias. Quando comemos, o intestino produz o hormônio GLP-1, que aumenta os níveis de insulina no sangue, reduz a produção de açúcar pelo fígado, desacelera a digestão e diminui o apetite.
“Os hormônios GLP-1 são os ‘grandes reguladores’ de todo o nosso metabolismo,” explica Chris Damman, gastroenterologista e professor associado clínico da Universidade de Washington, nos Estados Unidos.
“Esses mecanismos são bastante complexos, envolvendo muitos hormônios diferentes,” acrescenta.

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É possível imitar o GLP-1 por meio da alimentação?
Os dois principais componentes da dieta ligados ao GLP-1 são as fibras e os polifenóis.
“A fibra é o alimento preferido dos trilhões de bactérias que vivem no nosso intestino,” explica Mary Sco, médica residente e autora de textos sobre nutrição na Virgínia, nos EUA.
Quando ingerimos alimentos ricos em fibras e polifenóis, eles são convertidos pelo microbioma intestinal em ácidos graxos de cadeia curta, que estimulam a produção de GLP-1. Entre os alimentos ricos em fibras estão nozes, leguminosas, frutas e vegetais. Já os polifenóis também são encontrados em frutas, verduras e oleaginosas.
Outro nutriente importante para o metabolismo é a gordura monoinsaturada, associada a níveis mais elevados de GLP-1. Ela está presente em azeite de oliva, abacate e nozes.
Esse processo começa antes mesmo de os alimentos chegarem ao intestino. Pesquisas mostram que o sabor amargo dos alimentos ricos em polifenóis ativa receptores gustativos que enviam sinais ao intestino para produzir hormônios digestivos, incluindo o GLP-1.
Mas estimular naturalmente o GLP-1 não depende apenas do que comemos – e sim de como comemos, diz Sco.
“Pesquisas recentes mostram que a ordem em que comemos também importa,” afirma.
Um artigo de 2020 indica que há evidências de que consumir alimentos ricos em proteína (como carne e ovos) e vegetais antes dos carboidratos resulta em níveis mais altos de GLP-1, em comparação com comer carboidratos primeiro. As razões por trás disso ainda não estão totalmente claras.

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O horário das refeições também parece interferir na quantidade de GLP-1 produzida pelo organismo. Pesquisas sugerem que o corpo libera mais GLP-1 ao comer no início da manhã do que à noite.
Esse efeito está ligado às mudanças naturais nos níveis hormonais ao longo do dia. Comer mais cedo, segundo estudos de 2023, ajuda a sincronizar o metabolismo com o ciclo circadiano.
Em tese, portanto, uma dieta rica em fibras, polifenóis e gorduras monoinsaturadas ajudaria a maximizar a produção de GLP-1. Mas, segundo Damman, as dietas ocidentais modernas são pobres nesses elementos.
“Esses medicamentos estão atuando sobre algo fundamental no nosso mecanismo de saciedade que foi ‘curto-circuitado’ pelos alimentos ultraprocessados,” diz ele.
Medicamentos ou dieta: o que funciona melhor?
Para algumas pessoas, uma alimentação equilibrada e atividade física são suficientes para perder peso. Para outras, os agonistas de GLP-1 são necessários, afirma Damman.
“A questão é que mudar comportamentos é extremamente difícil. Por isso, medidas de estilo de vida muitas vezes não funcionam para quem está preso em ciclos metabólicos. E é aí que esses medicamentos têm sido muito úteis para pessoas com obesidade severa e complicações.”
No fim das contas, uma dieta que estimula a produção natural de GLP-1 é baseada em alimentos in natura, como frutas, verduras, legumes e oleaginosas
Para outros casos, no entanto, uma dieta rica em fibras, polifenóis e gorduras saudáveis pode ajudar no controle do apetite, acrescenta Sco.
“Algumas pessoas não terão um benefício tão grande quanto com os remédios, mas ainda assim haverá efeito. Isso vale para todos, porque é fisiologia humana básica – todos nós recebemos o ‘sinal para parar de comer’.”
Para ele, é irônico que muitas pessoas estejam redescobrindo isso ao tentar imitar os efeitos dos remédios para emagrecer.
“A jornada deu uma volta completa,” afirma. “Tudo leva de volta aos alimentos naturais – não há substituto para eles.”
O futuro das pesquisas sobre GLP-1
Embora os medicamentos prescritos como GLP-1 sejam considerados seguros, ainda há muito que não sabemos sobre eles, diz Damman.
Segundo Gary Schwartz, professor de medicina, neurociência, psiquiatria e ciências comportamentais no Albert Einstein College of Medicine, em Nova York, os remédios também estão abrindo caminho para novas pesquisas sobre obesidade.
As causas do aumento global da obesidade são múltiplas e complexas, mas muitos especialistas apontam que nosso ambiente alimentar moderno é parte central do problema.
Segundo Schwartz, alimentos ultraprocessados – ricos em açúcar e gordura – exploram os componentes que nosso cérebro está biologicamente programado para buscar.
Quando consumimos esses alimentos, as áreas de recompensa do cérebro são ativadas, liberando dopamina, o que nos leva a comer mais. Com o tempo, perdemos a sensibilidade a esses estímulos e precisamos consumir quantidades maiores para alcançar a mesma sensação de prazer.
Dados recentes sugerem que os medicamentos com GLP-1 reduzem esse desejo por alimentos ultrapalatáveis, além de provocar náusea e outros efeitos gastrointestinais, diz Schwartz.
“Isso indica que existe um mecanismo que pode ser aproveitado para restaurar hábitos saudáveis sem depender de medicamentos, limitando a recompensa e alcançando a saciedade sem comer em excesso,” explica.
Os pesquisadores esperam estudar a atividade cerebral e o comportamento alimentar durante a perda e o reganho de peso para identificar intervenções alimentares e físicas com efeitos semelhantes aos dos medicamentos.
“Será necessário fazer estudos clínicos e dietéticos combinados com exames de imagem e manutenção da perda de peso. Mas, dentro de uma década, teremos uma ideia clara dos ‘pontos-chave’ no cérebro e de como direcioná-los com alimentação ou mudanças comportamentais,” prevê Schwartz.