Crédito, Embaixada do Brasil nos EUA
- Author, Alessandra Corrêa
- Role, De Washington para a BBC News Brasil
O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, e o secretário de Estado americano, Marco Rubio, se reuniram por uma hora nesta quinta-feira (16/10), na Casa Branca, em Washington.
Os dois chanceleres fizeram uma primeira reunião reservada de cerca de 15 minutos, e logo após um segundo encontro, de aproximadamente 45 minutos, que teve a participação do representante de comércio dos EUA (USTR, na sigla em inglês), Jamieson Greer, e de diplomatas dos dois lados.
Logo após as reuniões, o ministro foi para a Embaixada do Brasil em Washington, sem comentar sobre as conversas. Vieira deve dar uma declaração sobre o resultado do encontro ainda nesta quinta.
A expectativa é de que esse encontro entre os chefes da diplomacia do Brasil e dos Estados Unidos sirva para preparar uma reunião formal entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Donald Trump, ainda sem data definida.
Esta foi a primeira reunião presencial oficial entre autoridades dos dois países desde o início da crise desencadeada a partir de julho, quando os Estados Unidos começaram a anunciar medidas contra o Brasil em resposta ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, que é aliado ideológico de Trump.
Entre as medidas adotadas estão tarifa de 50% sobre a maioria dos produtos exportados do Brasil aos Estados Unidos, restrições de vistos a autoridades brasileiras e sanções financeiras pela Lei Global Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e sua mulher, Viviane Barci de Moraes.
Em paralelo ao anúncio das tarifas, o USTR, escritório chefiado por Greer, abriu em julho uma investigação contra o Brasil por supostas práticas desleais de comércio.
O governo Trump deixou claro diversas vezes que essas punições tinham natureza política. As medidas tiveram como pano de fundo a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente brasileiro.
O deputado se mudou para os Estados Unidos no início do ano e iniciou articulações junto à Casa Branca para buscar medidas contra o Brasil que pudessem pressionar pela absolvição e anistia do pai.
Apesar da pressão, Jair Bolsonaro foi condenado no mês passado pelo STF a 27 anos e três meses de prisão por tentativa de golpe de Estado após perder a eleição de 2022.
Além de não surtirem o resultado político esperado, as medidas contra o Brasil também tiveram impacto em setores econômicos de ambos os países, e desencadearam uma mobilização de empresários brasileiros para tentar destravar as negociações.
Foi nesse cenário que, após meses de escalada da tensão entre os dois países, uma breve interação de menos de um minuto entre Lula e Trump no fim de setembro, durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, marcou uma oportunidade de aproximação.
Ao cruzarem nos bastidores, após o discurso de Lula e antes do de Trump, ambos trocaram algumas palavras e até um abraço. Pouco depois, em sua fala diante do plenário, o americano disse que tiveram uma “química excelente” e que haviam combinado de se encontrar em breve.
Na segunda-feira passada (6/10), os presidentes tiveram uma videoconferência. Durante a conversa de 30 minutos, Lula pediu a Trump a retirada da sobretaxa imposta a produtos brasileiros e das medidas restritivas aplicadas contra autoridades do Brasil.
Também combinaram que Rubio e Vieira, além do vice-presidente brasileiro, Geraldo Alckmin, e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dariam sequência às negociações, que devem culminar com um encontro presencial entre os dois presidentes.
Ainda não há definição de data ou local para essa reunião presencial, mas uma possibilidade discutida durante a videoconferência foi a Cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), que será realizada na Malásia no fim deste mês. Segundo o Itamaraty, “Lula também se dispôs a viajar aos Estados Unidos”.
Dois dias após a videoconferência, Rubio convidou Vieira para a reunião presencial desta quinta, para dar continuidade às tratativas.
Petroquímica e preocupações

Crédito, BRENDAN SMIALOWSKI/AFP via Getty Images
Na quarta-feira (15/10), véspera da reunião entre Vieira e Rubio, o presidente brasileiro voltou a falar sobre sua interação com Trump. “Não pintou química, pintou uma indústria petroquímica”, disse Lula em um evento no Rio de Janeiro.
No entanto, os aparentes gestos positivos ainda não resultaram na retirada das medidas contra o Brasil.
Também na quarta, um dia antes de se encontrar com a equipe brasileira, Greer voltou a justificar as tarifas, em entrevista coletiva em Washington.
Greer observou que existem atualmente dois regimes de tarifas contra o Brasil: a tarifa recíproca de 10%, aplicada contra todos os países, e uma sobretaxa de 40% “relacionada a sérias preocupações com o Estado de Direito, censura e direitos humanos no Brasil”.
Sem citar o nome de Moraes, Greer disse que “um juiz brasileiro tomou para si a autoridade de ordenar que empresas americanas se autocensurem, dando-lhes ordens secretas para gerenciar o fluxo de informações, o Estado de Direito em relação a oponentes políticos no Brasil.”
Nesse momento, o secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, que estava ao lado de Greer, complementou: “E a detenção ilegal de cidadãos americanos que estavam no Brasil”.
Apesar de Bessent não ter elaborado o comentário, parece ser uma referência ao caso de Jason Miller, ex-porta-voz de Trump que foi detido por algumas horas no aeroporto de Brasília, em 2021. Na época, Miller era CEO da rede social GETTR e foi questionado pela Polícia Federal.
Enquanto as equipes diplomáticas de ambos os países se preparavam para a reunião, o deputado Eduardo Bolsonaro também circulava por Washington nesta semana, em contatos com o Departamento de Estado e a Casa Branca.
O governo brasileiro sempre deixou claro que a questão política não é negociável e que a condenação de Bolsonaro é tema de responsabilidade do Judiciário, e não do Executivo.
Na videoconferência entre Lula e Trump, o ex-presidente brasileiro não foi citado, e as menções feitas durante a conversa foram à relação comercial.
Trump chegou a dizer a Lula que os americanos sentiam falta do café brasileiro, um dos produtos que ficaram mais caros em razão da sobretaxa.
Enquanto para o Brasil o objetivo principal é a retirada das tarifas e sanções, ou pelo menos redução da sobretaxa, do lado americano há uma série de temas que poderiam levar a um acordo.
Entre as principais questões de interesse dos Estados Unidos estão a abertura do mercado brasileiro para o etanol americano, o acesso à exploração de minerais críticos e a regulação das big techs no Brasil, que é alvo de críticas e preocupação por parte do governo Trump.