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É o primeiro encontro entre os dois desde que Washington impôs tarifas de 50% sobre produtos brasileiros — medida que provocou a maior crise diplomática recente entre os países.
Numa rápida conversa com jornalistas antes do início da reunião, Trump disse ser “uma honra estar com o presidente do Brasil”.
“Acredito que seremos capazes de fazer ótimos acordos para os dois países”, disse ele.
Já Lula prometeu “boas notícias” após a reunião. “O Brasil tem todo o interesse de ter uma relação extraordinária com os Estados Unidos, não há nenhuma razão para qualquer desavença entre os dois países”, disse ele.
“Na hora em que dois presidentes se sentam e cada um coloca o seu ponto de vista, os seus problemas, a tendência é encaminhar um acordo”, complementou Lula.
O presidente do Brasil ainda disse que tinha uma longa pauta de assuntos que gostaria de discutir com Trump.
O presidente dos EUA afirmou que ele e Lula “chegarão a uma conclusão rapidamente”.
Ao ser questionado sobre se a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) seria assunto da reunião, Trump não confirmou nem descartou essa possibilidade.
“Eu sempre gostei do Bolsonaro. Me senti mal com o que aconteceu com ele. Ele está passando por muita coisa”, comentou ele.
Durante a semana, os dois governos trataram o encontro com cautela.
Até as últimas horas, nem Brasília nem a Casa Branca haviam confirmado oficialmente a reunião, embora os líderes tivessem deixado a agenda livre antes do jantar oferecido pelo primeiro-ministro da Malásia.
A conversa aconteceu em Kuala Lumpur no período da tarde (de madrugada no horário de Brasília).
Na ocasião, o americano afirmou que houve “química excelente” com o brasileiro e indicou estar disposto a fazer uma reunião bilateral.

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Nesta sexta-feira (24/10), Lula afirmou a jornalistas em Jacarta, na Indonésia, que não haveria “assunto proibido” no encontro.
“Tenho todo interesse nessa reunião. Quero mostrar que houve equívoco nas taxações, mostrar com números”, disse o presidente brasileiro. “Se eu não acreditasse que é possível chegar a acordo, eu não faria reunião.”
Trump também comentou sobre a possibilidade de reunir-se com Lula durante a viagem para a Malásia.
O principal objetivo do encontro era tentar destravar o impasse comercial e reduzir as tensões criadas pelas sobretaxas impostas por Washington.
Nesta segunda (27/10), Lula completa 80 anos, mesma idade de Trump. A semelhança foi usada pelo brasileiro para quebrar gelo no encontro.
A delegação brasileira inclui ministros de áreas estratégicas, como Alexandre Silveira (Minas e Energia), Carlos Fávaro (Agricultura), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia) e Mauro Vieira (Relações Exteriores).
Também acompanham Lula o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues.

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Do tarifaço ao encontro na Malásia

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Em julho, os Estados Unidos anunciaram tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, atingindo especialmente exportações agrícolas e de carne bovina.
Na época, o governo Trump deixou claro diversas vezes que essas punições tinham natureza política.
Além das tarifas, o Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) abriu uma investigação contra o Brasil, acusando o país de adotar “práticas comerciais desleais”.
A Casa Branca também impôs restrições de visto a autoridades brasileiras e sanções financeiras ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e à mulher dele, Viviane Barci de Moraes.
As medidas foram tomadas em meio julgamento que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por incitar ataques às instituições brasileiras.
O governo brasileiro classificou as sanções como um ataque à soberania nacional e uma tentativa de interferir na independência do Judiciário.
As sanções tiveram como pano de fundo a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente brasileiro.
O deputado se mudou para os Estados Unidos no início do ano e iniciou articulações junto à Casa Branca para buscar medidas contra o Brasil que pudessem pressionar pela absolvição e pela anistia do pai.
Em setembro, no entanto, Lula e Trump se cruzaram brevemente durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, mantendo contato próximo desde então.
Na conversa, Lula pediu a Trump a retirada da tarifa imposta aos produtos brasileiros e das medidas restritivas aplicadas contra autoridades brasileiras.
Na ocasião, Trump não teria respondido diretamente ao pedido de Lula para a retirada das tarifas e das sanções econômicas e de vistos. O presidente americano teria se limitado a dizer que o tema seria conduzido pelas equipes técnicas dos dois países.
Em uma breve declaração à imprensa, o chanceler brasileiro disse que encontro foi “muito produtivo, num clima excelente de descontração e de troca de ideias e posições de uma forma muito clara e muito objetiva”.
Segundo Vieira, houve “muita disposição para trabalhar em conjunto para traçar uma agenda bilateral de encontros para tratar de temas específicos de comércio”.
Pelo lado americano, Rubio e o representante de comércio dos EUA, Jamieson Greer, disseram em um comunicado conjunto que tiveram com o ministro brasileiro “conversas muito positivas sobre comércio e as questões bilaterais em curso”.
Segundo a nota, os três “concordaram em colaborar e conduzir discussões em múltiplas frentes no futuro imediato e estabelecer um plano de ação”.

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Mesmo com os esforços do encontro para tentar selar a paz, os dois líderes também deram sinais de que não pretendiam recuar de suas posições durante a semana que antecedeu o encontro.
Na quarta-feira (22/10), Trump afirmou que os pecuaristas americanos “estão indo bem” graças à tarifa imposta sobre o gado de outros países, como o Brasil.
“Os pecuaristas, que eu adoro, não percebem que a única razão pela qual estão indo tão bem — pela primeira vez em décadas — é porque impus tarifas sobre o gado que entra nos Estados Unidos, incluindo uma tarifa de 50% sobre o Brasil”, escreveu em sua rede social.
O republicano acrescentou que, se não fosse por ele, os criadores de gado americanos “estariam na mesma situação dos últimos 20 anos”, que classificou como “péssima”.
Já Lula, na quinta (23/10), voltou a defender alternativas ao dólar no comércio global. Durante a visita que faz à Indonésia, o presidente afirmou que tanto o Pix quanto o sistema de pagamentos indonésio têm potencial para facilitar o intercâmbio entre os dois países e entre os membros do Brics.
“O século 21 exige que tenhamos a coragem que não tivemos no século 20”, disse Lula, ao defender “uma nova forma de agir comercialmente, para não ficarmos dependentes de ninguém”, sem citar diretamente os Estados Unidos.
A defesa de moedas alternativas à americana, reforçada pelo Brasil durante a cúpula dos Brics em julho, foi apontada por Trump como um dos motivos para a imposição das tarifas às exportações brasileiras.
Por que reunião entre líderes importa

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Do ponto de vista brasileiro, as tarifas foram percebidas como arbitrariedade, já que os EUA acumulam superávit em sua balança comercial com o Brasil.
Em diversas declarações, Lula questionou a lógica das medidas, alegando que “a tese pela qual se taxou o Brasil não tem sustentação em nenhuma verdade”, e prometeu apresentar argumentos nessa linha durante o encontro.
As tarifas, que entraram em vigor em 6 de agosto, afetam diretamente setores estratégicos — especialmente exportadores agrícolas e pecuaristas.
Em agosto, o governo Lula anunciou um pacote de medidas para mitigar o impacto econômico do tarifaço. As ações incluem linhas de crédito subsidiadas, adiamento da cobrança de impostos e compras governamentais de alimentos dos setores impactados.
Do lado americano, a taxação pode inibir a importação de produtos do Brasil, levando os EUA a tentar aumentar a produção interna, a buscar mercados substitutos ou, caso essas duas alternativas não sejam bem-sucedidas, a reduzir a oferta interna desses itens.
Nesse último cenário, se não houver redução da demanda, a menor oferta pode ter como consequência aumento de preços.
Além do comércio e sanções, a regulação das big techs e da mineração de terras raras, são dois pontos centrais para os americanos. O acesso ao mercado de etanol no Brasil é outra prioridade.
*Com reportagem de Julia Braun, da BBC News Brasil em Londres, e Mariana Schreiber, da BBC News Brasil em Brasília