Criar um site do zero apenas com a descrição do que você quer e como quer, em uma mensagem de texto. É mais ou menos isso que uma nova leva de ferramentas de inteligência artificial tem oferecido. A ideia é que quem não sabe programar consiga desenvolver produtos digitais com base em instruções no estilo de “conversa”.
Para quem tem algum conhecimento em programação, esse tipo de ferramenta tem funcionado como um ponto de partida, uma primeira estrutura que depois é refinada, e também como experimentação. Quem nunca escreveu uma linha de código na vida (como eu) pode aproveitá-las para criar sites funcionais.
Desde o lançamento do ChatGPT, essa prática de programar a partir de conversas com uma IA ganhou nome próprio: é o chamado “vibe coding”. Entre as empresas que apostam no modelo, uma das promissoras é a sueca Lovable. Com apenas 45 funcionários e alguns meses com o sistema no ar, a startup foi avaliada em US$ 1,8 bilhão.
A proposta é que qualquer pessoa consiga criar sites e plataformas online. Ao acessar a Lovable, o usuário se depara com uma interface que tem, de cara, uma caixa de conversa em formato de chat. É ali que se escreve, em linguagem natural, o que se deseja criar.
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Foi exatamente isso que testamos. Em poucos minutos, o site de uma livraria fictícia estava no ar. Os detalhes solicitados também estavam lá: um carrossel com livros recém-chegados, um espaço no formato calendário para eventos e um espaço para envio de newsletter. Nem tudo, porém, funcionou.
1. Como funciona o Lovable
O acesso ao Lovable é gratuito, mas há limitações para quem não paga pelo serviço (a assinatura parte de US$ 25 por mês, cerca de R$ 134). Sem assinar, o usuário tem direito a usar cinco créditos por dia na plataforma, o que significa que pode gerar até cinco solicitações completas à IA. O teto é de 30 créditos por mês.
Mesmo na versão gratuita, é possível criar um site. Para quem vai fazer o experimento, uma boa sugestão é refinar bem o comando inicial (chamado de “prompt”) antes de escrevê-lo na Lovable. Assim, você reduz a chance de ter que fazer muitos ajustes no projeto – e aí gastar mais créditos.
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Uma opção é ir no ChatGPT, ou em outra ferramenta de IA, e descrever exatamente que tipo de site gostaria de criar, com quais cores, textos, funcionalidades, modelo de organização das informações e recursos (autenticação de usuário ou área para compras, por exemplo). O mesmo vale para quem quer criar projetos mais elaborados, como lojas virtuais de e-commerce, sistemas de reserva e ingressos, ou ferramentas de produtividade.
Ao fazer o pedido para a IA, é possível anexar imagens e documentos e indicar o uso dessas fontes para informações ou como referência. Outra opção é conectar a criação do site a uma base de dados própria. Depois de enviar o comando (o “prompt”), é preciso esperar alguns minutos — uma janela lateral é aberta com o protótipo do projeto.
Apesar de estar em inglês, o Lovable “entende” português, que pode ser usado para escrever os comandos.
2. Teste: criamos um site em minutos com IA
Para testar o “vibe coding”, pedimos para a Lovable criar um site simples, de uma página, de uma livraria independente. Havia indicação de estilo do lugar (aconchegante e acolhedor) e como a página deveria ser construída – um cabeçalho e um menu de navegação com rolagem entre as diferentes seções (“Nossa História”, “Recém-chegados”, “Próximos encontros” e “Contato”).
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Em “Recém-chegados”, a IA precisava criar um carrossel com capas de livros e indicação de título e editora. Depois, vinha um calendário com espaço para nome de próximos eventos, data e descrições breves. Por fim, um espaço para o usuário cadastrar o email. No rodapé, endereço, telefone e ícones de rede social.
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Rapidamente, a página estava pronta (clique aqui para ver o resultado). Bem simples, é verdade, mas com todas as funções que tinham sido pedidas. Para quem entende de programação, pode editar o resultado diretamente no código, que fica disponível na barra superior do site.
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A opção mais simples para quem não sabe programar é clicar no botão de “edição”, no canto inferior esquerdo. Ali, é possível fazer alterações manualmente (por exemplo, trocar uma imagem de lugar ou reduzir um título) ou por texto (escrevendo o pedido em uma mensagem). Depois do site pronto, pedi que a IA colocasse um sombreado amarelo no cabeçalho, o que foi feito.
Depois de receber o site ou sistema, o usuário também pode “conversar” com a Lovable para entender como trabalhar com o projeto. A função, chamada de “chat”, é feita para tirar dúvidas antes de solicitar as mudanças – por exemplo: “como posso estruturar essa funcionalidade?” ou “como poderia fazer essa mudança?”.
3. O “Vibe-coding” vai acabar com a programação?
No site fictício da livraria, perguntei como faria para receber os e-mails de quem se cadastrasse no site. Aí entra uma camada mais técnica: a integração da Lovable com ferramentas externas, como plataformas de envio de e-mails ou as chamadas APIs, que funcionam como pontes para conectar o site a outros sistemas.
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As integrações são essenciais também para quem quiser embarcar uma IA no site, implementar um sistema de pagamento ou conectar o projeto a um banco de dados, planilha ou aplicativo externo. Nesses casos, o usuário pode precisar fazer inserções no código, com orientação do Lovable.
Depois do projeto feito, basta publicá-lo. O site ganha o domínio .lovable.app. Para os assinantes, há a opção de conectar o site a um domínio próprio ou comprar um novo domínio, o que tira a identificação da Lovable. A plataforma também permite que outras pessoas acessem o mesmo projeto e façam alterações em tempo real. No caso de programadores, há funções adicionais (pagas) para inspecionar e editar o código-fonte, além de garantia da “propriedade” do código.
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Apesar de ter virado uma febre e realmente poder ser útil, vale lembrar que o “vibe coding” não faz milagre, nem o Lovable. No caso de projetos complexos, com múltiplos sistemas, integrações e exigências altas de segurança, é difícil imaginar que alguém que não sabe programar chegará tranquilamente a um bom resultado.
No fim, o site da livraria, por exemplo, foi ao ar, mas seguiu sem integração real com a caixa de e-mails — depois de muitos erros e tentativas frustradas de conectar a API certa (mesmo com a IA pacientemente tentando ajudar). Os créditos do dia, então, acabaram. Provavelmente com mais pesquisa e esforço daria certo, mas a impressão é que nem só de “vibe-coding” se constrói algo.