Os mercados financeiros reagiram com otimismo após o bom desempenho do partido do presidente Javier Milei nas eleições legislativas do país. O resultado superou as previsões mais otimistas, afastando, por ora, os temores dos investidores de que os planos do governo de forte ajuste fiscal poderia ser deixado de lado.
Os títulos da dívida pública argentina subiram com força nesta madrugada. Um dos papeis mais negociados, com vencimento em 2035, era cotado a 70,34 centavos de dólar, em alta de mais de 13 centavos e num patamar recorde, segundo dados compilados pela Bloomberg. Os títulos argentinos lideraram os ganhos entre seus pares de mercados emergentes.
Com mais de 90% das urnas apuradas, o partido de Milei obteve 41% dos votos, conquistando 64 cadeiras das 127 em disputa na Câmara dos Deputados e 13 das 24 vagas abertas no Senado, de acordo com dados divulgados pelas autoridades eleitorais locais na noite de domingo. O mercado previa que a coalizão governista venceria cerca de 30% das cadeiras. O peso já registrava ganhos no mercado de criptomoedas no domingo, à medida que os resultados eram anunciados.
— A dimensão da vitória de Milei está no limite mais otimista das expectativas pré-eleitorais. Seu partido agora detém o capital político necessário para acelerar as reformas estruturais — disse Alejo Czerwonko, diretor de investimentos para mercados emergentes das Américas no UBS Global Wealth Management.
Os resultados também devem ajudar a dissipar dúvidas sobre a continuidade do apoio crucial dos Estados Unidos. Antes da votação, o governo do presidente americano Donald Trump havia oferecido um socorro ao país por meio de uma linha de swap (troca de moedas) de US$ 20 bilhões com o banco central argentino para ajudar a estabilizar o peso, e estava em negociações com um grupo de bancos para um pacote adicional de financiamento de US$ 20 bilhões.
Trump havia sinalizado anteriormente que poderia retirar seu apoio se a agenda de Milei fosse derrotada, dizendo a repórteres:
— Se ele vencer, ficaremos com ele; s
O peso também deve se recuperar, já que “o mercado estava excessivamente posicionado em dólar antes da eleição”, disse Matias Montes, estrategista da EMFI Securities.
A chegada de Milei à presidência argentina em 2023 desencadeou uma onda de otimismo no mercado financeiro, que levou à valorização de todos os ativos argentinos, de ações na Bolsa a títulos públicos. Os papéis da dívida em dólar do país registraram valorização de de 144% desde sua eleição.
Esses ganhos começaram a se desfazer no mês passado, após o fraco desempenho de Milei em eleições locais. Os rendimentos dos títulos soberanos com vencimento em 2035 dispararam para acima de 17%, enquanto a moeda chegou a cair até 7% em um único pregão, à medida que os investidores passaram a questionar a capacidade de Milei de obter apoio suficiente no Congresso para aprovar sua ampla agenda econômica.
O apoio sem precedentes do Tesouro dos Estados Unidos ajudou a conter as perdas, mas não foi suficiente para reverter o sentimento negativo. Declarações conflitantes de autoridades americanas e argentinas — muitas vezes sem detalhes concretos — alimentaram ainda mais a volatilidade.
A intervenção direta dos Estados Unidos tem evitado uma disparada do dólar frente ao peso, o que é crucial para Milei evitar um ressurgimento da inflação. O câmbio tem ficado, assim, dentro dos limites da banda cambial do país, negociada no mais recente acordo da Argentina com o Fundo Monetário Internacional (FMI), firmado em abril.
Embora nenhum dos dois governos tenha confirmado o tamanho da intervenção, operadores estimam que os EUA já gastaram mais de US$ 1 bilhão comprando pesos e oferecendo dólares.
Apesar disso, o peso continuou a se desvalorizar, encerrando a sexta-feira a 1.492 por dólar, a poucos centavos do limite da banda cambial daquele dia (pelo acordo com o FMI, quando o peso ultrapassa a banda, o BC local pode intervir e vender dólares no mercado à vista para segurar as cotações).
Milei e seu partido “emergiram como grandes vencedores, com um mandato renovado”, disse Kathryn Exum, codiretora de pesquisa soberana na Gramercy Funds Management:
— Com essa vitória, os governadores e políticos deverão estar dispostos a trabalhar com Milei, abrindo a possibilidade para reformas.
Antes da votação, estrategistas de alguns dos principais bancos de Wall Street apostavam que Milei obteria cerca de um terço dos votos — o suficiente para garantir ao presidente poder de veto e limitar o Congresso de inviabilizar seus planos. Para os investidores, o apoio dos Estados Unidos, combinado a uma mudança mais pragmática e moderada de Milei, poderia oferecer alívio à moeda enfraquecida do país.
A vitória decisiva coloca o partido de Milei “em boa posição” para negociar com outros grupos e aprovar as reformas, segundo Joaquín Bagues, diretor-gerente da corretora local Grit Capital Group.