A COP30 é janela geopolítica para o Brasil se posicionar como parceiro sustentável e estratégico em minerais críticos. A matriz energética e as reservas que o país detém desses recursos são vantagens competitivas, e podem atrair interesse no momento em que a corrida global pela transição energética se acelera e desencadeia disputa global pelos minerais, aplicados em tecnologias verdes e de defesa, mas concentrados em poucos países.
A mensagem é de estudo da PwC ao qual o Valor teve acesso, que mapeia os diferenciais e gargalos do país. A predominância de renováveis na matriz energética — que inclui também os setores de transporte, indústria e outros usos –, cerca de metade, e na elétrica, que chega a quase 90%, são ativos competitivos para a produção de minerais de baixo carbono, afirma o levantamento da consultoria.
Para a sócia e líder de mineração e siderurgia da PwC Brasil, Patrícia Seoane, o potencial brasileiro se amplia frente às reservas de minerais como nióbio, grafita, níquel e terras raras. “Quem tiver acesso ao maior volume de reservas e produção desses minerais terá grande poder global”. No caso das terras raras, cuja segunda maior reserva mundial está no Brasil, o tema já despertou interesse americano em meio às negociações do país com os Estados Unidos.
O Brasil, segundo o Serviço Geológico dos EUA (USGS, na sigla em inglês), abriga cerca de 23% das reservas conhecidas do grupo de terras raras, mas ainda produz menos de 1% do total mundial. Em grafita, possui 26% das reservas, mas apenas 4,3% da produção. Já em níquel, detém 12% das reservas e 2,1% da oferta global. Por outro lado, é líder mundial em nióbio, com 94% das reservas e 92% da produção global.
Mas, para a PwC, o desafio é conectar a mineração à indústria de transformação tecnológica para romper com a lógica em que o país exporta concentrados minerais e, depois, importa componentes já com alto valor agregado.
“Temos reservas superimportantes, mas ou ainda não as exploramos de maneira plena ou o fazemos de maneira muito primária, crua, com o beneficiamento e refino sendo feito fora do Brasil”, afirma Seoane. Ela diz que o país “deixa dinheiro na mesa” exportando o produto não beneficiado.
Segundo a consultoria, a presença do Brasil em setores industriais como siderurgia, metalurgia e química poderia ser articulada para absorver parte da transformação local dos minerais, e é outra vantagem do país. Mas falta política industrial estruturada para minerais críticos, como já tem países como os EUA, Canadá, Austrália e a União Europeia, diz o estudo da consultoria.
A Indonésia, líder mundial em reservas e produção de níquel, reconfigurou a dinâmica do comércio internacional do metal na última década, depois de adotar série de políticas protecionistas. E entre 2019 e 2024, atraiu mais de US$ 2,3 bilhões para a instalação de plantas de processamento do mineral, que fez do país elo essencial na cadeia global de baterias. Para a PwC, o Brasil poderia tomar o exemplo para si.
“O país criou uma proibição à exportação, para que o mineral, obrigatoriamente, tivesse que ser processado internamente. Concedeu benefícios fiscais e reduções de determinados impostos, além de tarifas de importação para máquinas necessárias para a construção da indústria de refino”, afirma Seoane.
Segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), projetos de minerais críticos devem receber cerca de R$ 100 bilhões em investimentos entre este ano e 2029. A consultoria diz que é preciso transformar o capital em ganho estrutural com a verticalização de cadeias produtivas no país.
Cita, entre medidas importantes para a finalidade, a criação de zonas de desenvolvimento mineral-industrial abastecidas por energia renovável, além da necessidade de acordos bilaterais e multilaterais que garantam acesso à tecnologia, mercados premium e parcerias estratégicas. Para Seoane, a conferência pode ajudar nisso. “Na COP30, teremos diversos ‘players’ internacionais discutindo transição energética, cujo núcleo são os minerais críticos”.
A diretora-executiva do think tank Instituto E+ Transição Energética, Rosana Santos, lembra que a mineração é uma atividade com alto nível de impacto, que, por mais sustentável que possa se apresentar, traz impactos, sejam sociais ou ambientais.
“Então, se é para termos impacto em território nacional, que isso traga agregação de valor na cadeia, aumento de PIB [Produto Interno Bruto], aumento de empregos e que torne a nossa complexidade industrial mais tecnológica”, afirma.
Shigueo Watanabe Jr., pesquisador do Instituto Climainfo, diz que exportar o minério apenas como commodity pode até trazer recursos, mas não tiraria do país a necessidade de seguir importando baterias, circuitos, chips e painéis solares, por exemplo. “Traz dinheiro, mas não alavanca desenvolvimento”, afirma.
Mas, enfatiza, para se proteger de riscos socioambientais ligados à exploração e à industrialização dos minerais, o país precisa garantir a responsabilidade daqueles que possam causar danos. “[É preciso] Fazer valer leis existentes, como o licenciamento ambiental, o Código Florestal, a regulação que exige avaliações ambientais estratégicas nos territórios e no mar territorial, o respeito e a obrigatoriedade à OIT 169, que deve ser estendida a toda e qualquer comunidade que possa ser afetada por projetos”, completa.