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segunda-feira, novembro 3, 2025

Indústria brasileira perdeu 15 mil vagas com tarifaço, estima estudo

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Cerca de 15 mil empregos industriais formais foram destruídos no Brasil entre agosto e setembro deste ano por causa das tarifas impostas ao país para exportar aos Estados Unidos. Os impactos se concentram nas regiões Sul e Sudeste, especialmente em São Paulo, e na indústria de refino de açúcar. É o que aponta um estudo do coordenador de pesquisa macroeconômica André Valério e do assistente de pesquisa Gustavo Menezes do banco Inter.

Valério e Menezes cruzaram dados de comércio exterior do Brasil com os microdados do Caged (cadastro do governo federal para emprego com carteira assinada) em um modelo estatístico que permite estimar os impactos da dependência comercial dos EUA na geração local de vagas para a indústria de transformação.

“As evidências preliminares apontam para um impacto substancial e significativo do tarifaço no padrão de contratações para agosto e setembro, resultando na destruição de 15 mil empregos nesse período”, afirmam.

De acordo com dados do Caged divulgados na semana passada, foram gerados quase 364 mil postos formais de trabalho no Brasil entre agosto e setembro deste ano. “No agregado, não vemos impacto. Mas, quando conseguimos estimar as regiões que são mais dependentes das exportações aos EUA, elas, de fato, foram afetadas”, afirma Valério.

Regiões mais dependentes dos EUA foram afetadas”

— André Valério

Entre 131 regiões que ele e Menezes chamam no estudo de “intermediárias” – isto é, agrupamentos de municípios com características similares -, que têm exposição à exportação de bens manufaturados aos EUA, 60 apresentavam variação interanual dessas exportação positiva em julho de 2025. Dois meses depois, esse contingente caiu para 28, enquanto 63 regiões apresentavam forte queda nas exportações. É o maior registro desde a greve dos caminhoneiros de 2018, que provocou contração aguda na produção industrial da época, lembram os economistas.

“Criamos uma medida de difusão, porque olhar usando diretamente o saldo agregado geraria uma variância da estimativa muito elevada. Conseguimos delimitar até o nível de cidade e ver as localidades mais expostas aos EUA, até porque a organização espacial da indústria leva em consideração essas questões regionais. Então, comparamos com regiões que não foram afetadas, aplicando variáveis de controle”, explica Valério.

Decompondo os efeitos das tarifas a nível estadual e setorial para a indústria de transformação, eles observaram que os impactos são bastante concentrados. De todas as perdas empregatícias, 30% estão na indústria de alimentação, mais especificamente do refino de açúcar, atividade tipicamente aglutinada em São Paulo.

Segundo os economistas, o Estado reuniu pouco mais de um quarto de todos os empregos industriais perdidos até setembro. “Resta saber como o setor reagirá nos próximos meses à queda de cerca de 80% nas exportações de açúcar do Brasil para os EUA que foi observada com o início do tarifaço”, afirmam Valério e Menezes.

Os resultados, dizem, também apontam para contratações abaixo do usual nos demais Estados e setores, com destaque para a perda estimada de cerca de 4.500 empregos na região Sul, onde diversas localidades são dependentes das indústrias de bens de capital cuja produção é quase inteiramente exportada aos EUA.

Reportagem do Valor já havia mostrado que a economia do Sudeste seria a mais afetada pelo tarifaço americano, não fosse a ampla lista de isenções, enquanto o Sul, também uma das regiões mais impactadas pelas tarifas, foi menos contemplado pelas exceções.

As tarifas parecem já ter atingido as principais pautas de exportação aos EUA atreladas a bens de capital, afirmam Valério e Menezes. Aeronaves, motores e máquinas elétricas registraram contração acima de 30% em agosto e setembro, ante o mesmo bimestre do ano anterior, observam. “Na última PIM [pesquisa do IBGE sobre a produção industrial], setores que tiveram variação negativa foram justamente aqueles mais expostos aos EUA”, diz Valério.

Bens industriais têm mais dificuldade de adaptação nas cadeias comerciais do que commodities, por exemplo, por serem menos homogêneos, observam os economistas do Inter.

“Com a abertura do diálogo entre os dois governos [do Brasil e dos EUA], esperamos que esses danos sejam limitados, mas não podemos descartar efeitos prolongados devido à inércia inerente às relações econômicas”, afirmam Valério e Menezes.

Considerando apenas agosto, a estimativa era que mais empregos tinham sido destruídos por causa do tarifaço, 23 mil, conta Valério. “O impacto diminuiu com os dados do Caged de setembro. Mas ainda está muito recente e tem uma incerteza elevada. Pode ser que, no fim das contas, o impacto se anule com o passar do tempo. Com a aproximação dos governos e eventual retirada de tarifas, é um fator que vai confundir. Há dúvidas se, de fato, esses empregos foram destruídos, ou se é um ajuste temporário”, diz Valério.

Os presidentes brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e americano, Donald Trump, tiveram um primeiro encontro bilateral na última semana de outubro. Segundo reportagem do Valor, o Brasil deve ter conhecimento das demandas americanas na próxima reunião com representantes dos dois governos, que deve acontecer nos próximos 15 dias.

Estimar a transmissão do impacto comercial para a atividade econômica também não é uma tarefa trivial, ponderam os economistas. Dada a incerteza do momento, é possível, por exemplo, que as empresas não alterem seus planos de produção, acumulando estoques que serão suavizados posteriormente.

Ainda assim, para eles, pode ser que a magnitude desse choque exógeno no setor industrial, que corresponde a cerca de um quarto do PIB brasileiro, seja grande o suficiente para afetar as estatísticas agregadas de atividade econômica. Isso, dizem, pode gerar um novo desafio para o Banco Central, que vem procurando filtrar os ruídos nas estatísticas para dosar a restrição da política monetária em meio a um quadro de desaceleração errática na economia.

“Estamos em meio a um aperto monetário em que o BC está esperando para ver o efeito da política monetária na atividade. Se tiver um fator concorrente que também tende a deprimir a atividade – e, tudo o mais constante, o tarifaço teria um efeito negativo sobre o PIB -, complica para o BC separar os efeitos e saber se a contração vem da política monetária ou do tarifaço. O BC precisa ter grau de confiança de que a política monetária está atuando”, afirma Valério.

[Fonte Original]

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