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- Author, Thais Carrança, Mariana Alvim e Leandro Prazeres
- Role, Da BBC News Brasil em São Paulo e Brasília
O Congresso Nacional derrubou nesta quinta-feira (27/11) parte dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Lei Geral do Licenciamento Ambiental, chamada por ambientalistas de “PL da Devastação“.
Com a derrubada dos vetos pela Câmara e pelo Senado, voltam a valer algumas regras que haviam sido estabelecidas pelos parlamentares para o licenciamento ambiental e que Lula havia tentado tirar da legislação, sem sucesso.
Assim, a versão dos parlamentares entrará em vigor na forma de nova lei, numa derrota política para o governo.
Foi derrubado o veto de Lula a 52 pontos da lei, como o que amplia a possibilidade de licenciamento autodeclatório e que reduz a participação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em processos do tipo.
Produtores que estejam com o Cadastro Ambiental Rural (CAR) pendente também foram liberados da necessidade de licenciamento.
A discussão e decisão sobre a Licença Ambiental Especial (LAE) ficará para depois, já que o tema é tratado por uma medida provisória (MP) ainda sob análise do Congresso.
A LAE é voltada para empreendimentos considerados estratégicos pelo governo.
A organização Observatório do Clima afirmou em nota que a votação desta quinta no Congresso “mata” o licenciamento ambiental no Brasil.
“Na prática, os parlamentares reconstruíram o PL da Devastação, que enterra o licenciamento no país. É o pior retrocesso legislativo ambiental da história brasileira desde a aprovação da Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981”, disse o observatório, afirmando que organizações ambientalistas vão recorrer à Justiça para tentar derrubar a nova lei.
Lula vetou artigos como o que facilitava o desmatamento na Mata Atlântica e o que reduzia exigências para empreendimentos considerados de médio porte.
Os vetos foram anunciados no início de agosto por ministros, no último dia que o governo tinha para tomar essa decisão.
O projeto foi batizado como “PL da devastação” por ambientalistas, de um lado; do outro, defendido por segmentos como a bancada do agronegócio no Congresso como uma medida para “destravar” obras e empreendimentos econômicos.
Segundo representantes do Planalto, a estratégia adotada pelo governo foi a de vetar pontos considerados prejudiciais ao meio ambiente e propor, por meio de um novo projeto de lei ou de MP, alternativas ao texto aprovado pelo Legislativo, criticado por cientistas e ambientalistas.
Ambientalistas já criticavam a possibilidade de derrubada dos vetos mesmo antes dela se confirmar nesta quinta-feira.
“A derrubada dos vetos seria um ataque aos fundamentos da nossa política ambiental, conflitando com tudo o que o país defendeu na COP30. Colegiados como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e o próprio papel regulamentar da União ficam esvaziados”, afirmou Suely Araújo, do Observatório do Clima, antes da votação no Congresso, segundo a Agência Brasil.
Relembre os vetos de Lula e as mudanças decididas pelos parlamentares.

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Licença simplificada para empreendimentos
O governo havia vetado um trecho do projeto aprovado pelo Congresso que determinava que empreendimentos de pequeno e médio potencial poluidor pudessem passar pelo Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC).
Com o veto, apenas os projetos com pequeno potencial poluidor poderiam ser submetidos a este tipo de licenciamento.
Mas os parlamentares voltaram a permitir que empreendimentos de médio porte façam o LAC.
Esta modalidade de licenciamento é mais simples pois não há necessidade de o responsável pelo empreendimento apresentar ou realizar estudos de impacto ambiental.
Para obter a licença, o responsável pelo empreendimento deverá apresentar apenas um Relatório de Caracterização do Empreendimento (RCE).
Autodeclaratório, esse documento deverá conter informações como a localização, dimensões e atividade que se pretende desenvolver.
Para o Observatório do Clima, essa é uma das mudanças mais preocupantes a ser confirmada nesta quinta-feira.
“Com isso, cerca de 90% dos licenciamentos estaduais – que representam a imensa maioria dos licenciamentos do país – poderão ser feitos automaticamente, num apertar de botão. A medida contraria jurisprudência do STF, que já havia vetado autolicenciamento para projetos de médio porte”, disse a organização.
Regionalização de critérios para o licenciamento
O governo também havia vetado um trecho do projeto que delegava aos Estados e municípios a possibilidade de estabelecer seus próprios tipos de LAC e critérios sobre potencial poluidor de um empreendimento.
“A proposição legislativa é inconstitucional, pois desconsidera a competência da União para definir regras gerais”, dizia um trecho do veto publicado pelo governo em agosto.
Com a derrubada dos vetos pelos parlamentares, os governos locais voltam a ter maior autonomia.
O temor entre ambientalistas é que esta regionalização dos critérios possa reduzir os padrões e exigências ambientais feita por Estados ou municípios.
Mata Atlântica
O governo havia vetado o trecho da lei que retirava o regime de proteção especial previsto na Lei da Mata Atlântica nos casos de supressão da floresta nativa.
A Mata Atlântica é um dos biomas mais ameaçados do Brasil e se entende pela costa brasileira, uma região densamente povoada.
Antes das novas regras de licenciamento ambiental, cabia ao governo federal avaliar o status de conservação do bioma e sua capacidade para suportar eventuais supressões de vegetação nativa.
Com a derrubada do veto de Lula, a lei tira do governo federal essa atribuição.
Povos indígenas e quilombolas

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Os parlamentares reverteram o veto de Lula a um dos trechos mais polêmicos da lei que havia sido aprovado pelo Congresso Nacional: o que liberava o processo de licenciamento ambiental sem consulta à Funai e à Fundação Palmares em terras indígenas e quilombolas que ainda não foram homologadas (a última etapa do processo de demarcação desse tipo de território).
Pelas regras anteriores à nova lei, as duas entidades precisavam ser consultadas em processos de licenciamento com impacto direto ou indireto em terras indígenas ou quilombolas, mesmo que estas não tivessem sido homologadas.
Agora, com a decisão do Congresso, comunidades não homologadas não precisarão mais ser consultadas.
Ambientalistas afirmam que essa mudança prejudicará dezenas de povos indígenas e comunidades quilombolas, pois a maioria das terras em que há presença dessas populações ainda não foi homologada.