A forma como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) foram implementadas no Rio de Janeiro foram a “fagulha” que resultou na expansão da facção criminosa Comando Vermelho (CV) para outros estados.![]()
Essa constatação foi apresentada pelo coordenador Geral de Análise de Conjuntura Nacional da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Pedro de Souza Mesquita, à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência, nessa quinta-feira (6).
Segundo o agente da Abin, a chegada das UPPs nessas localidades forçou os líderes do CV a fugirem do Rio de Janeiro, resultando em uma ampliação geográfica da facção criminosa pelo país.
“A fagulha desse processo é uma externalidade negativa do próprio projeto de UPP”, disse Mesquita durante audiência da comissão.
Novas áreas de atuação
“E, a partir do momento em que esses líderes são levados a deixar o Rio de Janeiro, eles inevitavelmente buscam, nas fronteiras norte, outros lugares para atuar, se organizar e poder retornar ao Rio. Esse processo vem desde 2013 e teve seu ápice no ano passado”, acrescentou.
De acordo com o coordenador do órgão central da atividade de inteligência do país, o mapeamento desse processo, conduzido com o objetivo de entender de forma mais precisa a situação da segurança no estado, e suas possíveis implicações para outras unidades da Federação.
“Isso vem desde 2013, e teve seu ápice certamente no ano passado”, disse Mesquita ao informar que, naquele ano, o CV atuava no Tocantins, Pará, em Rondônia e Santa Catarina, além do Rio de Janeiro.
Ao longo de uma década, a expansão foi significativa. “Hoje, do Norte, a gente só não tem o Comando Vermelho como principal grupo em Roraima e no Amapá”, disse ele ao informar que a facção tem “presença relevante” nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, o Paraná e Rio Grande do Sul, mas que atuam também nas demais nos demais estados.
Ele explicou que a ampliação foi potencializada a partir do alinhamento com grupos criminosos que, na época, estavam enfrentando o avanço de outra facção criminosa em seus estados, o Primeiro Comando da Capital (PCC), com origem em São Paulo.
“O CV, então, começou a oferecer para esses grupos uma rede de acesso logístico a armas e drogas, por meio de uma cadeia de comando muito mais descentralizado do que a da facção paulista. A partir disso, a organização criminosa foi se proliferando”, completou.
PCC
Durante a audiência no Senado, Mesquita explicou que, se por um lado, o CV está ampliando nacionalmente seu campo de atuação, por outro o PCC tem ampliado sua atuação para outros países.
“Quando a gente fala hoje em transnacionalidade, a gente precisa olhar para esse ator conhecido como o Primeiro Comando da Capital. Esse é o maior case que a gente tem no país, e é sem sombra de dúvidas hoje o grupo que mais afeta a nossa estabilidade enquanto o país, perante a comunidade Internacional”, disse.
Segundo o coordenador da Abin, as investigações sobre a atuação do PCC mostram que esse avanço internacional vem sendo implementado desde 2016.
“Em 2018 a gente teve acesso a um comunicado deles convocando membros que falassem espanhol, para poder se proliferar pelos outros países”, disse. Naquele ano, a facção estava em 11 países, com cerca de mil membros.
“Hoje, 28 países têm a presença dessa organização criminosa, contando com mais de 2 mil membros. Isso é um processo que vem ocorrendo ao longo desses últimos 15 anos”, completou.
Governo do RJ
Contatado pela Agência Brasil, o governo do Rio de Janeiro informou que a nacionalização do Comando Vermelho “não pode ser atribuída exclusivamente” às UPPS.
A Secretaria Estadual de Segurança Pública confirmou que, de fato, o projeto, à época, concentrou-se na ocupação territorial, sem o devido acompanhamento de políticas públicas integradas, o que teria inviabilizado sua sustentabilidade no longo prazo.
“Naquele momento, a ampla divulgação das ações e a pressão sobre os territórios controlados pelo tráfico levaram muitos criminosos a se deslocarem para outros municípios e estados, o que contribuiu para o processo de expansão do Comando Vermelho”, acrescentou.
A Secretaria reforçou que “esse movimento teve vários fatores” e, na sequência, reafirmou a necessidade de união dos governos federal, estadual e municipal no combate ao narcotráfico.