Instituições de finanças tradicionais nos Estados Unidos, Europa e Ásia estão entrando no mercado de stablecoins agora que as incertezas regulatórias estão diminuindo.
Empresas de pagamento como PayPal, Mastercard e Visa estão lançando stablecoins, integrando a liquidação com stablecoins em seus sistemas de pagamento ou construindo infraestrutura para dar suporte a elas.
A corrida não se limita às corporações, mas também está se desenvolvendo no nível bancário. No início de outubro, um grupo de grandes bancos internacionais, incluindo Goldman Sachs, Deutsche Bank, Bank of America, BNP Paribas e Citi, formou um consórcio para explorar a emissão de uma moeda digital “lastreada em reservas” em blockchains públicas.
O desenvolvimento acelerou depois que o Guiding and Establishing National Innovation for US Stablecoins (GENIUS) Act foi sancionado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em 18 de julho. Diferentes entidades estão escolhendo modelos distintos, desde stablecoins totalmente colateralizadas para o varejo até depósitos tokenizados e tokens de liquidação no atacado.
Veja como essa corrida está se desenrolando.
GENIUS dá a largada na corrida das stablecoins dos EUA
Antes do GENIUS Act, o principal caminho para as stablecoins nos Estados Unidos era o regime de autorização fiduciária de Nova York. O PayPal seguiu essa rota em agosto de 2023 ao emitir o PayPal USD (PYUSD) por meio da Paxos, licenciada pelo Departamento de Serviços Financeiros do Estado de Nova York.
A Fiserv, sediada em Wisconsin, anunciou a FIUSD em junho de 2025 e planeja integrá-la aos sistemas bancários e de liquidação de comerciantes até o final do ano, utilizando a infraestrutura da Paxos e da Circle. Após a sanção do GENIUS Act, a Fiserv expandiu sua estratégia de stablecoin ao firmar parceria com o Bank of North Dakota no projeto-piloto de liquidação interbancária “Roughrider Coin”.
A Mastercard juntou-se à Global Dollar Network da Paxos em junho de 2025 para permitir a liquidação com stablecoins em suas redes de comerciantes e pagamentos, ampliando o suporte para PYUSD, USDC e FIUSD. A Visa começou a liquidar USDC na Ethereum em 2021 e estendeu o serviço para a Solana em 2023, permitindo que processadoras como Worldpay e Nuvei liquidassem obrigações diretamente em stablecoins em vez de transferências bancárias.
Bancos de custódia e fiduciários avançaram para garantir a camada de serviços de ativos. O BNY Mellon agora faz a custódia das stablecoins emitidas pela Ripple e pelo Société Générale.
Alguns bancos estão adotando uma abordagem diferente. O JPMorgan está testando seu token de depósito, JPMD, na Base. Segundo a divisão de blockchain do JPMorgan, a Kinexys, os tokens de depósito são uma alternativa às stablecoins para liquidações em dinheiro e pagamentos voltados a seus clientes institucionais.
Grandes varejistas também estão explorando emissões próprias. Walmart e Amazon estariam avaliando stablecoins com suas marcas. Enquanto isso, a processadora de remessas Western Union está preparando a USDPT na Solana para transferências internacionais.
O GENIUS Act entra em vigor após um período de implementação de 18 meses ou 120 dias após a publicação das regras finais.
MiCA já está em vigor, mas o dólar ainda domina as stablecoins
As stablecoins lastreadas em euro ainda representam apenas uma pequena fatia do volume global de stablecoins, com a maior parte da liquidez concentrada nas stablecoins atreladas ao dólar, como USDC e USDT. Essa dominância foi estabelecida antes do GENIUS Act. E, com os gigantes TradFi dos EUA avançando rapidamente no ecossistema de stablecoins, espera-se que essa liderança se amplie.
“Sem uma resposta estratégica, a soberania monetária e a estabilidade financeira da Europa podem se deteriorar”, alertou Jürgen Schaaf, assessor de pagamentos do Banco Central Europeu, em uma publicação no blog da instituição.
A transição da Europa para as stablecoins está sendo moldada pelo regulamento de Mercados em Criptoativos (MiCA), que entrou em vigor para stablecoins em meados de 2024. O conjunto de regras oferece aos bancos e instituições financeiras reguladas um caminho para emitir stablecoins denominadas em euro, e a atividade de stablecoins em conformidade vem acelerando desde então.
Na França, a divisão de ativos digitais do Société Générale, a SG-Forge, emitiu as stablecoins EURCV e USDCV, com custódia feita pelo BNY Mellon. Na Alemanha, a AllUnity, uma joint venture entre DWS, Deutsche Bank, Galaxy e Flow Traders, lançou a stablecoin EURAU e planeja expandi-la para múltiplas blockchains.
Um dos movimentos mais relevantes veio de um grupo de nove bancos europeus que trabalham para criar uma alternativa conjunta. ING, UniCredit, KBC e DekaBank estão entre os que formaram uma empresa nos Países Baixos para emitir uma stablecoin em euro.
O projeto deve ser lançado em 2026 e é apresentado como parte dos esforços do bloco para garantir soberania nos pagamentos e reduzir a dependência da infraestrutura de stablecoins sediada nos Estados Unidos.
A corrida fragmentada das stablecoins na Ásia
A abordagem da Ásia em relação às stablecoins está se desenvolvendo de acordo com as regras regulatórias regionais, em vez de um modelo transfronteiriço como o MiCA.
O Japão implementou o regime mais antigo de stablecoins entre as principais economias. As emendas à Lei de Serviços de Pagamento entraram em vigor em junho de 2023, criando uma categoria legal para stablecoins “emitidas por instituições”, que devem ser totalmente resgatáveis pelo valor nominal e emitidas por bancos, empresas fiduciárias ou transmissores de dinheiro licenciados.
Os megabancos do país, Mitsubishi UFJ, Sumitomo Mitsui e Mizuho, vêm trabalhando para um lançamento conjunto de uma stablecoin lastreada em ienes, com possível estreia no fim do ano fiscal, que se encerra em 31 de março. A Mitsubishi anunciou na sexta-feira que sua emissão de stablecoin foi aprovada pela Agência de Serviços Financeiros.
O regime de Hong Kong entrou em vigor em agosto sob a supervisão da Autoridade Monetária de Hong Kong (HKMA). Diversas empresas demonstraram interesse, mas a HKMA alertou que a maioria dos candidatos terá seus pedidos rejeitados. Gigantes chinesas de tecnologia também se inscreveram para obter uma licença de stablecoin em Hong Kong, mas, segundo relatos, suspenderam seus planos devido à pressão de Pequim.
Um dos anúncios de maior destaque veio de uma joint venture planejada entre o Standard Chartered Hong Kong, a Hong Kong Telecom e a Animoca Brands, que pretende emitir uma stablecoin lastreada no dólar de Hong Kong assim que receber a licença.
Limpando a imagem das stablecoins
As stablecoins ganharam destaque regulatório após o colapso do UST da Terra em 2022, que expôs os riscos sistêmicos dos mecanismos de paridade algorítmica.
As regras introduzidas desde então geralmente definem as stablecoins como tokens totalmente lastreados em dinheiro ou ativos líquidos de curto prazo e resgatáveis pelo valor nominal. Isso, na prática, exclui as stablecoins algorítmicas das emissões licenciadas, embora elas continuem existindo em nichos das finanças descentralizadas.
Uma regulamentação mais clara abriu caminho para que entidades TradFi entrassem no mercado com stablecoins gerenciadas centralmente e tokens de depósito emitidos por bancos. Esses instrumentos estão sendo integrados às redes de pagamento, sistemas de liquidação e fluxos corporativos já existentes.
Como resultado, as stablecoins estão cada vez mais funcionando como infraestrutura operacional de pagamento e liquidação em transações de consumo, transferências institucionais e operações internacionais.