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quinta-feira, novembro 13, 2025

Slogan do governo antecipa a campanha de Lula

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O governo federal lançou um novo slogan: “Do lado do povo brasileiro”. À primeira vista, soa inofensivo — até redundante. Afinal, todo governo, por definição, deveria estar ao lado do povo. A redundância, porém, não é descuido, mas estratégia. Ao proclamar estar “do lado do povo”, o governo coloca seus adversários, por contraste, no “outro lado” — contrários ao povo. O que se apresenta como lema administrativo desloca, na prática, a comunicação governamental do terreno informativo para o da adesão, típico das campanhas eleitorais.

Isso não é trivial. O slogan aparece como assinatura de toda a comunicação governamental, impondo-se a ministérios, autarquias, fundações e estatais. Também serve de mote criativo para campanhas institucionais, reforçando a mensagem. E não se limita à publicidade paga. Está presente em discursos, materiais oficiais e redes sociais. Em suma, permeia e condiciona tudo o que é comunicado — e faz isso com recursos públicos.

Adotar um código de campanha já no slogan revela um problema mais profundo: o uso da comunicação governamental como instrumento de disputa política. Não se trata de exclusividade do governo Lula, mas o que se vê agora é uma intensificação preocupante.

Democracias maduras já enfrentaram esse dilema e fixaram regras proibindo qualquer traço de disputa eleitoral nas comunicações oficiais. Foram além: vedaram o uso de recursos públicos em mensagens de autoelogio e autopromoção. O juízo de mérito deve caber à sociedade, nunca ao próprio governo.

No Brasil, a regra geral até existe, e com status constitucional: a publicidade oficial deve ter caráter educativo, informativo ou de orientação social — sem promoção pessoal. É possível discutir aperfeiçoamentos nas normas infraconstitucionais, mas não é aí que está o verdadeiro problema. Ele é estrutural — e político.

A Secom, órgão responsável pela comunicação do governo, além de estar sob o comando do responsável pela última campanha eleitoral de Lula, não dispõe de carreira pública nem de quadro técnico permanente. Todos os cargos são de livre nomeação e podem ser substituídos a qualquer momento. Esse arranjo permite que a comunicação seja moldada inteiramente pelo grupo político de ocasião, sem freios institucionais nem memória técnica.

A escala também importa. A Secom administra contratos que ultrapassam R$ 600 milhões por ano — em publicidade, comunicação institucional, produção de conteúdo, pesquisas e, em breve, serviços digitais. Somam-se a isso contratações pontuais, como eventos. É um volume expressivo, superior ao orçamento de investimento de vários ministérios, com real poder de influenciar a formação da opinião pública.

Além de sua força própria, a Secom é, por lei, o órgão central de comunicação do Executivo. Coordena e integra não apenas a publicidade, mas também os patrocínios; estabelece diretrizes para toda a máquina federal; define a “voz única” do governo; e exerce influência sobre a EBC, que controla rádios, TV e agência de notícias.

Não se questiona a importância da Secom, nem o volume de recursos que administra. A comunicação é parte vital de qualquer governo e tornou-se ainda mais estratégica na era digital. Não por acaso, o Reino Unido a reconhece como um dos quatro principais instrumentos de ação estatal, ao lado da legislação, da regulação e da tributação. Mas, justamente por essa relevância, a exigência de impessoalidade e de finalidade pública precisa ser ainda maior.

O novo slogan “Do lado do povo brasileiro” é a face visível de uma distorção mais profunda. A comunicação governamental deve existir exclusivamente para informar e orientar o cidadão, não para elogiar mandatos nem antecipar campanhas. A eleição deve nascer nos partidos e no debate público mediado pela imprensa. No governo, não pode começar — e, se começou, não deve prosseguir.

*João Paulo Silveira é auditor público

[Fonte Original]

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