A repetição de ciclos autoritários mostra como as sociedades, incapazes de lidar com traumas históricos, alimentam mecanismos excludentes. A demonização dos imigrantes talvez seja o mais vistoso sintonia desse retrocesso, o pretexto ideal para que líderes manipuladores, hábeis em fomentar o medo, preservem sua influência e eternizem-se no poder. Atribuir a culpa por fracassos civilizacionais ultrajantes como o desemprego, a pauperização, a miséria e a fome ao “outro” — o negro, o caipira, o estrangeiro, o ignorante, o analfabeto — é um expediente primário, mas efetivo, quanto a se garantir a manutenção de um sistema injusto, violento, pensado para isolar ricos de pobres, assegurados todos os privilégios daqueles. “Uma Batalha Após a Outra” é uma tentativa louvável de se abrir os olhos do mundo para a escalada de tensão e caos que toma a política, enrosco que nem a ONU controla mais. Entretanto, há alguns problemas a destacar.
Paul Thomas Anderson possui um talento especial para levar essas histórias delirantes, farsescas, não raro patéticas, que chegam ao público sob a forma de verdades imperscrutáveis. Em seu roteiro, o diretor bate na tecla de guerrilheiros empenhados numa campanha de resistência contra uma engrenagem invisível, mas enérgica, que caça dissidentes de uma forma de governo que flerta com o totalitarismo. O filme abre com o French 75, um exército paramilitar de cidadãos descontentes, numa ofensiva metódica na fronteira entre os Estados Unidos e o México. As tropas conseguem invadir o alojamento das Forças Armadas americanas e libertar os imigrantes que aguardam pela deportação, mérito de Perfidia Beverly Hills, a líder do movimento. Anderson estica a corda ao opor Perfidia e o coronel Steven J. Lockjaw após a vitória dos rebeldes no primeiro combate, numa das cenas mais estranhas da história do cinema. E o que vem a seguir não vexa menos.
O encontro dos personagens de Teyana Taylor e Sean Penn define muito do que acontecerá no restante dos 162 minutos, retrato de uma acidentada obsessão sexual fartamente subsidiada por racismo e misoginia, decerto a mensagem mais forte do longa, livremente inspirado em “Vineland” (1990), a epopeia futurista de Thomas Pynchon. Esse joguinho de gata e rato prolonga-se para além do plausível, obnubilando aquele que poderia ser “o” assunto, a decisão de Perfidia de separar-se de seu companheiro, Bob Ferguson, logo depois de ter Willa, a filha dos dois. Leonardo DiCaprio e Chase Infiniti fazem por merecer suas respectivas indicações ao Globo de Ouro, das nove que o filme recebeu, e salvam “Uma Batalha Após a Outra” da derrota total.
Filme:
Uma Batalha Após a Outra
Diretor:
Paul Thomas Anderson
Ano:
2025
Gênero:
Ação/Drama/Suspense
Avaliação:
7/10
1
1
Giancarlo Galdino
★★★★★★★★★★