Um impulso sincronizado entre as políticas fiscal e monetária nos Estados Unidos, somado ao início de um ciclo de descompressão da política monetária brasileira têm potencial para pavimentar um cenário mais favorável para a economia do Brasil em 2026. A avaliação é do sócio e head do Departamento Econômico e Data Science da Vinci Compass, José Carlos Carvalho, que aponta como principais vetores de um ambiente econômico favorável os estímulos americanos, a possível desvalorização do dólar e a melhora das expectativas de inflação no Brasil.
Segundo Carvalho, os Estados Unidos operam hoje com “os dois motores no máximo”. De um lado, o governo anunciou o pacote fiscal “One Big Beautiful Bill”, fortemente expansionista; de outro, a política monetária caminha na mesma direção. A taxa de juros americana, que chegou a 5,25%, já recuou para 3,75%, e a tendência é de novas reduções, sobretudo diante da busca do presidente Donald Trump por um nome claramente dovish (a favor de políticas econômicas mais flexíveis) para comandar o Federal Reserve (FED).
“A soma dessas políticas empurra a economia americana para frente e produz um ambiente de mais apetite por risco, o que afeta positivamente os mercados emergentes, como o Brasil”, afirma.
Embora exista o risco de que o excesso de estímulo gere inflação nos EUA, o economista observa que a pressão atual ocorre apenas sobre bens, enquanto a inflação de serviços vem recuando. Os efeitos, caso apareçam, levariam pelo menos um ano para se materializarem. Enquanto isso, o humor dos mercados tem refletido o ambiente mais expansionista, e o real aparece entre as moedas que podem se beneficiar de um dólar mais fraco. Com juros menores nos EUA e uma intenção explícita do governo americano de desvalorizar a própria moeda para fortalecer sua indústria, o Brasil poderia ver o câmbio se aproximar de R$ 5.
“Um real mais forte ajuda no controle da inflação e abre espaço adicional para a queda da Selic”, explica Carvalho.
As tarifas americanas impostas a diversos países ao longo de 2025 também não alteram substancialmente essa dinâmica para o Brasil. Como a pauta exportadora nacional é dominada por commodities, cujos preços seguem cotações internacionais, a capacidade de taxação pelos EUA é limitada e o custo tende a recair sobre o importador: “O impacto foi menor do que se imaginava. No saldo, o ambiente americano segue positivo para o Brasil: crescimento acelerado, dólar mais fraco e mercados com mais apetite para risco.”
No outro polo da economia global, a China vive um descompasso estrutural entre produção elevada e consumo doméstico fraco. A perda de fôlego do mercado imobiliário e a dificuldade em reativar esse motor de crescimento alimentam preocupações sobre o médio prazo. Ainda assim, o sócio da Vinci Compass avalia que a situação não configura motivo de alarme imediato para o Brasil. A demanda chinesa por minério pode arrefecer, mas petróleo e soja, os grandes pilares das exportações brasileiras, têm diversificação geográfica suficiente para compensar eventuais perdas. “Não é uma situação de pânico. A economia chinesa segue crescendo, ainda que com desafios importantes.”
Perspectiva de queda da Selic
Se o cenário externo tende a se alinhar a favor, o quadro doméstico ainda reflete os efeitos de um ano marcado por inflação mais alta e juros reais na casa de dois dígitos. Depois de um início robusto, o PIB brasileiro praticamente estagnou: 1,5% de crescimento no primeiro trimestre, 0,3% no segundo e apenas 0,1% no terceiro. “Enquanto outros países já cortam juros, como os EUA, os da zona do euro, México e Chile, o Brasil manteve o juro real extremamente alto.”
A boa notícia, segundo o economista, é que o quadro começa a apresentar sinais de reversão. A situação fiscal apresentou melhora marginal ao longo de 2025, e as expectativas de inflação recuaram neste fim do ano, criando espaço para que o Banco Central inicie um ciclo de queda da Selic em janeiro de 2026: “A combinação de inflação em queda e crescimento rodando abaixo do potencial abre caminho para a reversão desse juro nas máximas históricas.”
A eventual virada do ciclo monetário pode produzir também uma mudança na dinâmica de comportamento dos investidores. Com o juro real tão elevado, o capital foi mantido majoritariamente na renda fixa, comprimindo preços de ativos e alimentando aversão ao risco. Mas a precificação futura já embute cortes de juros e parte do mercado se antecipa, deslocando recursos para a bolsa, que renovou recordes recentes.
“A renda variável sofreu muito e está com grande desconto. Observamos que já há investidores que estão se posicionando em ativos de risco antes da queda efetiva da Selic, na expectativa de capturar no preço esse movimento de recuperação”, acrescenta Carvalho.
O head do Departamento Econômico da Vinci Compass reforça que o processo será lento, mas de grande relevância. Se o cenário externo seguir favorável, com estímulos americanos sustentando o apetite global por risco, e o interno confirmar a melhora das expectativas, 2026 pode ser um ano favorável para a economia local: “Depois de um longo período de compressão, os ativos brasileiros têm espaço para respirar. A convergência dessas variáveis cria uma oportunidade para a economia voltar a crescer de forma mais equilibrada.”