Os mercado de trabalho no trimestre móvel encerrado em novembro permanece aquecido, mostrando que a política monetária restritiva e o crescimento moderado não geraram o esperado ponto de inflexão visível no mercado de trabalho. A taxa de desemprego caiu para 5,2% no trimestre móvel encerrado em novembro e renovou o menor patamar da série histórica no Brasil, com total de 5,6 milhões de desempregados.
O contingente também é o menor já alcançado desde 2012. Ao mesmo tempo, a população ocupada atingiu recorde de 103,2 milhões de pessoas. Após alta nos primeiros meses de 2025, movimento típico de início de ano, a taxa de desemprego vem recuando ou se mantendo no menor patamar da série histórica.
Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada na terça-feira (30) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A taxa de 5,2% ficou abaixo do verificado no trimestre anterior, encerrado em agosto (5,6%), e abaixo do resultado de igual período de 2024 (6,1%).
O resultado ficou abaixo da mediana das expectativas de 21 consultorias e instituições financeiras ouvidas pelo Valor, que apontava para uma taxa de 5,4% no trimestre móvel encerrado em outubro. A taxa de 5,2% era o piso das projeções, que iam até 5,5%.
Segundo especialistas, o resultado apurado entre setembro e novembro, mesmo com a sazonalidade típica de fim de ano, surpreendeu o mercado e sinaliza um indicador resiliente, robusto e entrando 2026 com maior ocupação formal, menor informalidade e desalento.
Tais características indicam melhora qualitativa do emprego no país, que driblou uma desaceleração mais forte e clara registrada em outros segmentos da economia. Por isso, deve ser uma “pulga atrás da orelha” do Banco Central sobre quando cortará os juros no próximo ano, explica Rodolpho Tobler, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
O economista reforça que o mercado de trabalho voltou a apresentar um nível de aquecimento semelhante ao do início do ano, após sinais pontuais de perda de ritmo ao longo do segundo semestre.
“O resultado é bastante positivo e reforça um cenário de mercado de trabalho favorável ao longo do ano. Se os resultados de dezembro continuarem no mesmo patamar, pode-se prever uma entrada de 2026 mais positiva”, acrescenta Tobler.
Para a coordenadora das pesquisas de amostras de domicílio do IBGE, Adriana Beringuy, os resultados até novembro já permitem classificar o ano de 2025 como “bastante satisfatório”. Ela lembrou que a taxa de desemprego mais alta registrada ocorreu no trimestre encerrado em setembro de 2020, quando atingiu 14,9%, durante os primeiros meses da pandemia.
Embora cautelosa, a coordenadora não descarta a possibilidade de a taxa de desemprego encerrar 2025 abaixo dos 5%. “Pode ser que isso ocorra, se a gente olhar um retrospecto de que no quarto trimestre do ano tem registro das taxas mais baixas”, ponderou.
No mercado financeiro, C6 Bank e Banco Inter destacam a resiliência do mercado de trabalho diante de uma política monetária apertada. Porém, o conjunto das métricas sinaliza para um mercado de trabalho ainda bastante aquecido, mesmo com a sazonalidade de novembro, período em que há mais contratações no varejo pelo fim de ano.
Ainda assim, o C6 Bank, calculou a série com ajuste sazonal, que elimina efeitos pontuais do calendário, e vislumbrou um recuo da taxa de desemprego de 5,6% para 5,5% em novembro, alcançando também o menor patamar da série. “Isso mostra que o mercado de trabalho segue sólido no Brasil”, descreveu a economista-chefe do C6 Bank, Claudia Moreno, em nota.
A instituição prevê uma manutenção desse quadro nos próximos meses e projeta que a taxa de desemprego encerre 2025 abaixo de 6%. Contudo, apesar dos efeitos positivos sobre a atividade econômica, o cenário também traz desafios para a política monetária, especialmente no controle da inflação de serviços.
“Um mercado de trabalho sólido ajuda a sustentar a atividade econômica, o que é positivo. Por outro lado, esse cenário traz desafios para o controle da inflação”, reforça a economista. O banco estima que o ciclo de cortes de juros comece em março, com a taxa básica chegando a 13% no fim de 2026.
Outros destaques na Pnad foi o recorda da população ocupada, com 59% no trimestre encerrado em novembro, o equivalente a 103,2 milhões de pessoas. A variação representa um avanço de 0,6% em relação ao trimestre anterior (mais 601 mil pessoas ocupadas). Já em comparação anual – com o intervalo de setembro a novembro de 2024, subiu 1,1% (1,1 milhão de pessoas).
Os números para diferentes formas de inserção no mercado: empregados com carteira no setor privado somaram 39,4 milhões, trabalhadores no setor público totalizaram 13,1 milhões e 26 milhões foram trabalhadores por conta própria.
Mais de 80% do aumento da ocupação no trimestre encerrado em novembro, ante o trimestre imediatamente anterior, vieram do grupamento de administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais, mostrou a Pnad.
Apesar da alta da formalidade, o economista sênior do banco Inter André Valério ressalva que a melhora ao longo do ano é concentrada no setor público. Enquanto no privado registrou-se crescimento estável no trimestre e de 2,6% no ano, o número de empregados no setor público no Brasil apresentou um aumento de 3,9% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior (setembro a novembro de 2024).
O grupo de Administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais foi o único a registrar aumento no número de ocupados, com a adição de 492 mil pessoas.
“Como a administração pública é menos sensível ao ciclo econômico, essa melhora do emprego não deve ser interpretada como um sinal de que a política monetária não esteja funcionando. Pelo contrário, os setores mais sensíveis à taxa de juros seguem sem apresentar dinâmica de aceleração do emprego”, destaca em nota.
Com uma percepção mais conservadora, Alberto Ramos, economista-chefe do Goldman Sachs, chama a atenção para a queda na taxa de participação e na força de trabalho ativa, métricas que podem denotar um eventual ponto de inflexão para 2026.
Ajustada sazonalmente, estima Ramos, a taxa de participação na força de trabalho subiu 0,1 ponto percentual em novembro, na variação mensal, ainda abaixo dos 62,6% de maio e do pico de 62,8%. Para ele, programas de transferências de renda e/ou benefícios fiscais generosos provavelmente estão enfraquecendo a participação na força de trabalho, particularmente entre os trabalhadores do setor informal. Nesse contexto, a expectativa é de que o Banco Central (BC) adote uma postura conservadora na calibragem da política monetária no curto prazo.
Mesmo assim, ele observa que o mercado de trabalho permanece aquecido. Ajustada sazonalmente, nota o economista, a taxa de desemprego caiu para 5,4%, um recorde de baixa e abaixo da faixa de estimativas da Nairu, o chamado nível de desemprego de equilíbrio, no qual teoricamente a taxa de inflação permanece constante, sem acelerar nem desacelerar.
Renda e massa de rendimentos
Até agora, o mercado de trabalho conseguiu manter a ocupação em alta, aumentando rendimentos e massa salarial, acrescenta a coordenadora. Além disso, o núcleo da inflação de alimentos em patamares controlados ajudou a liberar recursos do orçamento das famílias para consumo de bens e serviços.
“O mercado de trabalho hoje tem uma capacidade de retenção e manutenção de seu nível de trabalhadores em nível muito satisfatório. […] Quando tem conjunto significativo de pessoal ocupado, mobiliza uma massa de rendimentos grande”, disse Adriana Beringuy.
A renda média subiu 1,8% em relação ao trimestre móvel anterior (encerrado em agosto) para R$ 3.574, novo recorde para a métrica. A diferença é de R$ 65 a mais. Na comparação com igual trimestre de 2024, o aumento foi mais expressivo, de 4,5% (R$ 154 a mais).
Já a massa de rendimentos real habitualmente recebida por pessoas ocupadas (em todos os trabalhos) foi de R$ 363,7 bilhões no trimestre móvel encerrado em novembro. A alta é de 2,5% frente ao trimestre móvel anterior (encerrado em agosto) ou R$ 9 bilhões a mais. Frente a igual período de 2024, há aumento de 5,8% (mais R$ 19,9 bilhões).
Para 2026, Tobler avalia que a desaceleração da atividade deve começar a se refletir de forma mais clara, embora sem uma deterioração abrupta. “O cenário de 2025 não deve se repetir em 2026. A taxa de desemprego pode subir um pouco, mas ainda assim ficar abaixo dos 6,5% e até 6%, algo considerado muito positivo na série histórica do Brasil”, projeta.
Segundo o economista, entrar em 2026 com uma taxa mais baixa ainda seria um bom sinal. Contudo, a composição do crescimento econômico também será determinante. Mesmo com juros elevados, o mercado de trabalho ajuda a sustentar o consumo e “suaviza o pouso da economia.”
Desalento e informalidade
O contingente de pessoas desalentadas permaneceu em 2,6 milhões, com estabilidade no trimestre e queda de 12,9% no ano, o equivalente a menos 386 mil pessoas. O percentual de desalentados ficou em 2,3%, sem variação significativa no trimestre e com recuo de 0,3 ponto percentual na comparação anual.
Outro destaque positivo da pesquisa foi a queda da informalidade, que reforça a leitura de melhora estrutural do mercado de trabalho pelas vagas ocupadas com carteira assinada, segundo Tobler.
“A taxa de desemprego cai pelo aumento da população ocupada, e não porque tem menos gente procurando trabalho. O emprego formal ajudou a puxar esse movimento, e a informalidade está no menor nível da série histórica, desconsiderando o período da pandemia”, observa.
Contudo, ele pondera que a informalidade no Brasil ainda continua em níveis superiores a de outros países, impondo um desafio para os próximos anos na agenda pública do mercado de trabalho.