A pesquisadora e tradutora Alline de Souza Pedrotti, de 35 anos, irmã de Allane de Souza Pedrotti Matos, de 41 anos, uma das duas mulheres mortas na sexta-feira por um colega de trabalho dentro do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet), no Maracanã, acredita que o crime poderia ter sido evitado se a direção da instituição tivesse levado a sério as queixas da vítima. A outra vítima é a psicóloga Layse Costa Pinheiro. As duas foram sepultadas no final de semana. O caso está sendo investigado pela Delegacia de Homicídio da Capital, como duplo feminicídio.
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Alline conta que a irmã se queixava de que vivia amedrontada desde o começo do ano passado e que, além de o caso ser de conhecimento geral, ela não era a única pessoa que se sentia ameaçada por João Antônio Miranda Tello Gonçalves, que se matou em seguida. Numa conversa entre as duas irmãs em meados de 2024, Allane estava tão amedrontada que pediu a Alline para cuidar da filha dela, de 13 anos, caso acontecesse algo com ela.
— A direção não levou a sério esse caso. Deixou um cara entrar armado na instituição. Se tivesse levado a sério teria notado que ele era um sujeito perigoso e violento. Não era só minha irmã que se sentia ameaçada por ele. Soube que outras funcionárias ao tomaram conhecimento de que ele estava lá (no colégio) foram embora — disse a pesquisadora, acrescentando que a tragédia poderia ter sido maior já que tomou conhecimento de que o atirador levava 50 projéteis na mochila. — Poderia ter atentado contra vida de sabe lá quantas pessoas dentro da instituição. A conclusão que se chega a partir dos fatos é que a direção não se importa com as vidas que estão lá dentro.
Alline contou que, num primeiro momento, está em busca de respostas. Ela pretende se reunir com a diretoria do Cefet, acompanhada de um advogado, para entender como tudo isso aconteceu. Ela quer saber como se deu a liberação da entrada do funcionário na instituição, ainda mais estando armado.
—O que veio até mim é que ele chegou no Cefet pela manhã, cumprimentou as pessoas como se nada tivesse acontecendo e à tarde foi na sala de trabalho da minha irmã, que estava sentada trabalhando, e deu um tiro na nuca dela à queima-roupa. Ela estava de costas. Ele começou sendo covarde e foi covarde até o fim. Porque ele tirou a vida da minha irmã e da Layze e não quis se responsabilizar. Não teve coragem ou caráter para se responsabilizar pelos atos dele e tirou a própria vida.
Ela contou que a irmã desabafava constantemente com ela sobre como estava sendo penoso e difícil, ir ao Cefet, por conta dessa situação, que abalou demais.
— Ela me contou por alto que ele era um louco que não se dava bem com ninguém no Cefet. Pelo que eu sei ele fez alguma coisa errada e minha irmã apontou — disse acrescentando também que o atirador não se sentia confortável de ser chefiado por mulheres.
Por conta das ameaças e do medo, Alline contou que a irmã ficou meses afastada do Cefet, tendo passado esse período em home office. Essa mesma história é confirmada por Fabiano Magdaleno, professor de geografia da instituição e amigo de Allane, por quase duas décadas.
Segundo a irmã, Allane enfrentava quadro quadro depressão. Ao desabafar com Alline ela contava que queria muito conviver num ambiente leve de trabalho.
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— Ela se agarrava muito na música, na vida artística dela. Era isso que estava tirando ela da depressão. Era um lugar onde ela ela reconhecida. No Cefet ela não se sentia reconhecida nem protegida. Isso ela me falava bastante
A professora sempre foi apaixonada por música, estudou na Escola Villa Lobos e, segundo a família tocava vários instrumentos. Ela se apresentava em locais como o Clube Renascença, no Andaraí, com ao menos três grupos de samba: Quilombo Urbano, Resenha dos Amigos do Rena e Mensageiros do Samba.
Alline que mora em Florianópolis, Santa Catarina, há nove anos, sou da morte da irmã no mesmo dia, pelo pai, mas só conseguiu vir para o Rio no dia seguinte. Ela contou que ao saber do tiroteio no colégio e que a irmã tinha sido atingida imaginou inicialmente se tratar de assalto e torcia para que não Allane não tivesse sofrido nada grave. Mas, ao saber que João Antônio estava envolvido teve a certeza de que era algo direcionado a ela e passou a temer pela vida da irmã.
A professora Allane de Souza Pedrotti Matos foi atingida na cabeça e no ombro. A psicóloga escolar Layse Costa Pinheiro foi ferida na cabeça e no tórax. As duas chegaram a ser levadas para o Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro do Rio, mas não resistiram.
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De acordo com relatos, o funcionário João Antônio Miranda Tello Ramos Gonçalves chegou à escola pela manhã e cumprimentou todos normalmente. À tarde, ele entrou na direção e efetuou os disparos, acertando as duas mulheres, que trabalhavam na Diretoria de Ensino. Em seguida, o autor dos disparos tirou a própria vida.
Em nota divulgada no mesmo, a instituição disse que “a Direção-Geral do Cefet/RJ lamenta profundamente essa tragédia que chocou a comunidade acadêmica e decreta luto oficial por cinco dias na instituição a partir de 01/12/2025”.