Os suplementos alimentares invadiram gôndolas de supermercado, farmácias e lojas virtuais, com divulgação até mesmo em redes sociais, como o TikTok. Quem entrou na febre, porém, precisa ter atenção para não ser enganado ou fazer mau uso dos produtos. Especialistas e servidores de vigilância sanitária alertam: seu whey pode estar batizado.
Pesquisa feita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) identificou que 65% dos suplementos alimentares têm algum tipo de irregularidade, seja em informações no rótulo (como diferenças entre as quantidades de ingredientes informadas e as que o produto oferece de fato), ou em etapas anteriores à venda do produto, como testes de pureza necessários.
O levantamento, que reúne dados até agosto deste ano, expõe falhas de fiscalização e possíveis riscos à saúde em um mercado que apresenta forte crescimento.
Segundo a Anvisa, entre janeiro de 2020 e agosto de 2025, foram recebidas aproximadamente 5.000 queixas técnicas e denúncias sobre alimentos. Dentre as categorias envolvidas, 63% diziam respeito a suplementos alimentares.
A fiscalização abriu 1.574 dossiês para investigar irregularidades, as mais frequentes relacionadas a publicidade, rotulagem e problemas na composição. A agência aponta que suplementos irregulares vêm sendo divulgados e comercializados em sites de vendas on-line, como Shopee e Mercado Livre, sem possuir regularização sanitária.
As falhas não são encontradas somente no whey protein, mas em suplementos que prometem perda de peso, melhora do sono, crescimento do cabelo, entre outros.
O nutricionista Guilherme Schweitzer alerta que o consumo de produtos irregulares pode prejudicar a produção de nutrientes no organismo. Ele conta que já adquiriu um produto que se propunha a melhorar o sono, vendido no marketplace da Amazon. Após o consumo, percebeu que o produto era adulterado.
— É um duplo prejuízo. Além disso, o paciente pode manifestar sintomas dos mais diversos, a depender de qual suplemento tenha sido adulterado. Os mais comuns são: sensação de enjôo, náuseas, desconfortos gastrointestinais e dores de cabeça — explica.
De acordo com o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), houve um aumento de 37% nas vendas dos suplementos entre 2025 e 2024. Os problemas fizeram com que a Anvisa retirasse do mercado em novembro duas marcas de whey protein após identificar falhas no processo de regularização sanitárias dos produtos, comercializados em plataformas de comércio eletrônico.
O médico nutrólogo Sandro Ferraz aponta que houve uma disparada no consumo de suplementos alimentares no Brasil:
— O whey protein virou quase um item de cesta básica. Nas academias, nos feeds das redes sociais e até nas prateleiras online, a promessa é sempre a mesma: mais músculo, mais performance, mais saúde — afirma, mas acrescenta que é preciso tomar cuidado no consumo. — A maioria das pessoas não imagina, mas parte desses produtos pode conter menos proteína do que anuncia, ingredientes trocados, contaminantes invisíveis ou falhas graves nos testes de segurança.
O estudante de direito André Veloso comprou no ano passado um suplemento que prometia ganho de energia e disposição para ajudar durante sua rotina, entre estudos e exercícios físicos. Os efeitos colaterais se manifestaram no terceiro dia.
— Me veio uma sensação de enjoo muito ruim, e começou a bater uma ansiedade, taquicardia mesmo. Fiquei deitado por um tempo até me acalmar e joguei o produto fora logo — conta.
Em nota, a Anvisa diz que implementa um programa nacional de fiscalização dos suplementos, que segue critérios como número de denúncias recebidas, necessidade de investigação in loco, pedidos de apoio das vigilâncias sanitárias estaduais e gravidade do risco sanitário.
“Esse projeto se justifica pelo grande número de denúncias relacionadas a suplementos alimentares, envolvendo propagandas enganosas, composição irregular ou efeitos adversos”, diz a Agência.
Entre 2021 e 2024, foram inspecionadas 34 empresas fabricantes de suplementos alimentares. Destas, 22 (65%) apresentaram resultado insatisfatório, 8 (23%) tiveram que prestar esclarecimentos e apenas 4 (12%) tiveram resultado satisfatório no atendimento às regras de boas práticas de fabricação de alimentos e a adequação dos produtos à legislação sanitária vigente.
Segundo Sandro Ferraz, os riscos mais frequentes do consumo de suplementos irregulares incluem subdosagem de proteína e excesso de carboidratos — muitos wheys baratos compensam a baixa proteína com maltodextrina, aumentando glicemia, inflamação e ganho de gordura.
Também há risco de presença de impurezas, como metais pesados, microrganismos ou resíduos industriais, além de produtos perigosos para alérgicos sem a indicação.
Em nota, o Sindusfarma afirma que tem reforçado a orientação às empresas para o cumprimento rigoroso das normas de rotulagem, qualidade e conformidade sanitária. A entidade disse manter iniciativas de monitoramento do mercado digital e denúncias à Anvisa sobre irregularidades, apontando preocupação com a concorrência desleal.
Como evitar a compra de suplementos irregulares?
A Anvisa mantém no site um ambiente em que é possível consultar se os suplementos são regularizados e orienta que os rótulos sejam lidos com atenção. Confira as dicas para garantir a compra de produtos autorizados pela fiscalização:
- Consultar no site da Anvisa se o produto é regularizado
- Desconfiar de preços muito abaixo do mercado. Se o valor é “bom demais”, cuidado
- Verificar se o fabricante disponibiliza laudo laboratorial. Marcas que são referência costumam mostram resultados de proteína real por dose
- Checar ingredientes. Quanto mais curta a lista, melhor. Segundo especialistas, é melhor evitar: aromatizantes artificiais em excesso, maltodextrina oculta, blends sem especificação (“proteína do leite” sem detalhar qual)
- Sempre comprar de lojas confiáveis. Dê preferência a canais oficiais e evite marketplaces com vendedores desconhecidos.