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quinta-feira, julho 10, 2025

Taxação de Trump expõe desgaste com ações do STF contra Bolsonaro e articulação externa da oposição

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A decisão do governo de Donald Trump de determinar tarifa de 50% sobre produtos importados do Brasil é consequência de um conjunto de ações adotadas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva e pelo Supremo Tribunal Federal nos últimos anos. Uma delas é o processo judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), aliado de Trump, que tramita na Suprema Corte brasileira. Ao anunciar a taxação nesta quarta-feira (9), governo dos Estados Unidos disse que a forma como o Brasil tratou Bolsonaro “é uma vergonha internacional” e que o “julgamento não deveria estar acontecendo”. 

Membros da direita brasileira, aliados próximos, familiares de Bolsonaro e o próprio ex-presidente há anos têm salientado a perseguição política a esse grupo político e tentam reverberar as críticas ao STF, principalmente ao ministro Alexandre de Moraes, no exterior. Trata-se de uma tentativa de mostrar às democracias de outras nações o que ocorre no Brasil. As estratégias da oposição – capitaneadas pelo deputado licenciado Eduardo Bolsonaro nos EUA – têm surtido efeito ao alertar para a situação enfrentada por opositores de Lula.

Desde segunda-feira (7), Trump vinha criticando o Brasil pela postura contra Bolsonaro. Ele comparou as ações judiciais contra o ex-presidente brasileiro com sua situação antes de retornar à Casa Branca, classificando-a como um “caças às bruxas”.

Outro ponto citado pelo americano com relação ao STF foram as decisões da Corte contra empresas de mídia dos EUA. De acordo com Trump, a Suprema Corte “emitiu centenas de ordens de censura SECRETAS e ILEGAIS a plataformas de mídia social dos EUA, ameaçando-as com milhões de dólares em multas e expulsão do mercado brasileiro de mídia social”.

Para o cientista político Juan Carlos Arruda, CEO do Ranking dos Políticos, a manifestação do presidente dos EUA “projeta o embate jurídico brasileiro para a vitrine internacional, colocando ainda mais pressão sobre o STF”. Ele alerta que, em caso de condenação de Bolsonaro, especialmente se isso o tirar das eleições de 2026, “é possível que se intensifique a narrativa de perseguição política, não apenas no Brasil, mas entre setores conservadores globais”. Embora não acredite que isso vá alterar o curso institucional do país, Arruda destaca que “torna o custo reputacional mais alto para as instituições”.

Mas a decisão de Trump também é resultado do antiamericanismo de Lula, exposto em declarações recentes na Cúpula dos Brics, no Rio de Janeiro, em que os países-membros defenderam a adoção de um sistema de pagamento alternativo ao dólar. No domingo (6), o republicano já havia afirmado que iria impor uma tarifa adicional a “qualquer país que se alinhar às políticas antiamericanas do Brics”. A ameaça era de taxa de 10%, mas o anúncio desta quarta foi bem superior – com tarifa de 50% aos produtos brasileiros.

Aliado ao antiamericanismo da atual gestão, pesa contra o Brasil a decisão de Lula de se aproximar de governos ditatoriais e autocráticos. “O alinhamento do Brasil com China, Rússia, Irã, Venezuela e outros inimigos jurados dos EUA foi sendo mal-recebido pela diplomacia americana. Eles foram demostrando o desapontamento inicialmente de forma mais leve, depois de forma mais contundente”, explica o professor e doutor em Ciência Política Adriano Gianturco, coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec.

Gianturco lembra que o presidente Lula rompeu protocolos diplomáticos ao criticar duramente Trump durante a campanha presidencial americana e continuou com declarações desfavoráveis mesmo após a eleição do republicano. Além disso, teria se recusado a negociar diretamente as ameaças tarifárias em seus primeiros sinais, deixando a condução para o Itamaraty e setores produtivos.

“Houve aconselhamento técnico para evitar declarações polêmicas, mas o presidente [Lula] optou por manter uma linha política crítica ao Ocidente e às estruturas tradicionais, como a defesa da desdolarização do comércio internacional”, afirma. 

Opinião semelhante foi apresentada pelo cientista político Fábio Maia Ostermann, professor e mestre em Administração Pública pela Harvard Kennedy School. Ele avalia que a medida de Trump é um “reflexo da deterioração da imagem do Brasil, um país que, aos olhos do mundo, caminha cada vez ao lado do eixo global das ditaduras”. “A instabilidade institucional e a percepção externa de que há uma perseguição política ao ex-presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores têm um custo econômico real e previsível”, afirma Ostermann. 

Além disso, outra alegação do presidente dos EUA para impor a tarifa adicional é de que há uma relação comercial injusta entre os países – o que é contestado pelo governo brasileiro. 

O cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec de Belo Horizonte, vê uma escalada nas declarações de Trump. “Ele está indicando que vai intensificar a pressão contra o Brasil”, afirma.

Cerqueira também observa que o STF tem atuado de forma coesa, mas questiona até que ponto essa unidade resistirá a sanções externas: “Caso um deles sofra uma sanção pesada, como tudo indica que deva acontecer com Alexandre de Moraes, até que ponto os demais ministros vão querer embarcar nessa mesma canoa?”, questiona.

Além disso, ele aponta um impacto direto na política externa brasileira. “Essas declarações do Trump são indicativos de que o Brasil está entrando numa órbita de um país considerado até mesmo adverso em relação aos interesses americanos”, diz.

Segundo ele, o apoio do Departamento de Estado às críticas de Trump mostra que “o processo não é só do presidente, está avançando institucionalmente”. O especialista avalia que isso pode “isolar o Brasil no contexto do bloco ocidental como um país estranho, que não está de acordo com as diretrizes pensadas para países em favor da democracia”.

Já o doutor em Ciência Política Leandro Gabiati avalia que há um risco para a direita brasileira neste movimento. “Trump ajudou positivamente na estratégia de Bolsonaro enquanto se manteve no plano discursivo. Agora, no entanto, ao tomar medidas práticas que impactam o Brasil, o efeito pode ser o contrário ao esperado”, opina Gabiati. 

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Lula diz que tarifas de Trump serão respondidas com “reciprocidade”

Após o anúncio de Trump, Lula disse, na noite desta quarta-feira (9), que as tarifas impostas pelos Estados Unidos serão respondidas “à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica”. A reação foi articulada em uma reunião de emergência com ministros no Palácio do Planalto.

No documento direcionado a Lula, Trump afirmou ainda que, “se por algum motivo você decidir aumentar suas tarifas, então, qualquer que seja o número que você escolher para aumentá-las, será adicionado aos 50% que cobramos”.

A carta foi publicada no perfil de Trump na Truth Social, rede social criada por ele. Analistas afirmam que, embora vários trechos do documento sejam padronizados – a exemplo dos que foram mandados para outros seis países (Sri Lanka, Filipinas, Brunei, Moldavia, Argélia, Iraque e Líbia) -, o documento direcionado ao Brasil tem uma parte com tom pessoal de Trump – aquela em que o presidente dos EUA defende Bolsonaro.

Em resposta à decisão dos EUA, o petista afirmou também que o Brasil “é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém”. “O processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de Estado é de competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais”, disse o chefe do Executivo.

Ao mencionar a questão das empresas de mídia dos EUA que foram alvos de ações do STF, Lula disse que a “liberdade de expressão não se confunde com agressão ou práticas violentas” e ressaltou que “todas as empresas nacionais e estrangeiras estão submetidas à legislação brasileira”.

O mandatário brasileiro também contestou a justificativa econômica citada por Trump na decisão e citou dados do próprio governo americano. “É falsa a informação, no caso da relação comercial entre Brasil e Estados Unidos, sobre o alegado déficit norte-americano. As estatísticas do próprio governo dos Estados Unidos comprovam um superávit desse país no comércio de bens e serviços com o Brasil da ordem de 410 bilhões de dólares ao longo dos últimos 15 anos”, disse o petista.

Para o professor Elton Gomes, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), o embate entre Lula e Trump pode até reforçar a retórica do governo petista, mas com limitações importantes. Ele salientou que o caso brasileiro “é diferente da situação de outros países, como o Canadá. Lá, o tratamento hostil de Trump acabou fortalecendo a esquerda, que conseguiu se reorganizar. No Brasil, o cenário é outro.”

Segundo ele, o Brasil tem menos instrumentos de barganha e enfrenta fragilidades institucionais que dificultam uma resposta eficaz. “O Canadá tem finanças saneadas, equilíbrio fiscal e instituições robustas. O Brasil não tem isso. A gestão atual não tem como capitalizar esse confronto com os Estados Unidos da mesma forma.”

Gomes também aponta que o discurso de soberania adotado por Lula perde força diante de contradições na política externa. “O presidente brasileiro, em várias ocasiões, opinou sobre assuntos internos de outros países, o que fere o princípio da autodeterminação dos povos. Foi assim com a Argentina, com a Venezuela, com a Ucrânia e, mais recentemente, com Israel e o Irã.”

Para ele, esse comportamento afasta o Brasil de sua tradição diplomática. “O país tem se distanciado de valores como neutralidade, pragmatismo e multilateralismo, que sempre guiaram nossa política externa. Isso enfraquece o discurso e compromete a credibilidade internacional do Brasil.”

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Atuação da oposição brasileira internacionalizou embates judiciais de Jair Bolsonaro 

Desde 2019, a atuação de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), agora deputado federal licenciado, e de aliados no exterior buscou internacionalizar os embates judiciais de Jair Bolsonaro contra o STF e consolidar apoio político entre conservadores norte-americanos. A articulação, que envolveu encontros frequentes com assessores de Donald Trump e congressistas republicanos, avançou após a eleição de Lula e se intensificou com a inelegibilidade de Bolsonaro no Brasil. 

A relação foi alimentada por encontros com o próprio Trump e com congressistas republicanos, em uma aproximação que combinava interesses eleitorais e afinidades ideológicas.

Durante a pandemia e nas eleições americanas, Eduardo e figuras da oposição reforçaram o alinhamento com Trump sob a gestão de Jair Bolsonaro. Com a derrota de Trump em 2020, o grupo manteve os canais abertos com assessores e parlamentares que trabalharam na administração republicana. 

Após a vitória de Lula em 2022, Eduardo Bolsonaro e aliados intensificaram articulações com congressistas republicanos, apresentando a narrativa de que Bolsonaro havia sido alvo de um processo eleitoral injusto. A partir daí, o deputado ampliou encontros com lideranças conservadoras americanas, como Matt Gaetz, buscando apoio político e pressionando publicamente o governo Biden para se posicionar sobre a situação do ex-presidente brasileiro.

Com a inelegibilidade de Bolsonaro, em 2023, Eduardo e grupos alinhados ao ex-presidente buscaram internacionalizar o caso, realizando reuniões com parlamentares republicanos em Washington e participando de eventos conservadores nos EUA, como a Conferência de Ação Conservadora (CPAC). O objetivo era apresentar Bolsonaro como perseguido político e mobilizar a direita americana em torno de sua causa.

Em 2024, com Trump se fortalecendo como candidato viável nos EUA, as articulações ganharam novo fôlego. Parlamentares brasileiros passaram a focar sua atuação em denunciar as ações do ministro Alexandre de Moraes no âmbito dos inquéritos dos “Atos Antidemocráticos” e das “Fake News”. Em março, eles foram recepcionados por congressistas americanos e fizeram um pronunciamento em frente ao Capitólio – sede do Legislativo americano.

Com a volta de Trump em 2025, a oposição brasileira utilizou a cerimônia de posse do republicano como oportunidade para realizar novos encontros. O principal deles foi a reunião com Jim Pfaff, conselheiro de Trump. Na época, o assessor afirmou que faria tudo o que estivesse ao seu alcance para ajudar a direita brasileira. 

A movimentação mais recente ocorreu quando Eduardo se licenciou do cargo para focar suas articulações com aliados estrangeiros. Na época, o deputado paulista afirmou que iria se dedicar “integralmente” a buscar as “devidas sanções aos violadores de direitos humanos” e também a “resgatar liberdades perdidas” no Brasil. 

A ação resultou na abertura de um inquérito por parte de Moraes em maio. O magistrado atendeu a um pedido do procurador-geral da República, Paulo Gonet, para investigar o deputado que estaria agindo em “tom intimidatório” contra ministros do STF. As investigações deveriam ser concluídas em julho, mas Moraes prorrogou o inquérito por mais 60 dias nesta terça-feira (8).

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Relação entre Brasil e EUA tem se deteriorado 

O atrito entre Brasil e Estados Unidos se intensificou em fevereiro, quando o Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental dos Estados Unidos, órgão vinculado ao Departamento de Estado dos EUA, criticou o bloqueio de plataformas de redes sociais de matriz americana, como X e Rumble, por Moraes. Em resposta, o Itamaraty defendeu a decisão do ministro, alegando que o assunto se tratava de soberania nacional.

No entanto, o conflito veio a escalonar com a política tarifária de Trump. Na declaração final da Cúpula dos Brics, no domingo (6), o bloco criticou a tarifa adicional de 10% aventada naquele momento por Trump para países que estejam alinhados ao grupo. 

No mesmo documento, o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Egito, Etiópia, Indonésia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos também defendeu a Iniciativa de Pagamentos Transfronteiriços do Brics, uma modalidade de pagamento que seria alternativa à moeda americana.

No dia seguinte (7), o republicano afirmou que o Estado brasileiro realiza uma “perseguição” contra Bolsonaro, sua família e seus apoiadores. Ele também afirmou que acompanhará a situação de “muito perto” e que o “único julgamento que deveria estar acontecendo é um julgamento pelos eleitores do Brasil”.

No mesmo dia, Lula afirmou que o Brasil era um país soberano e que não aceitaria “interferência ou tutela de quem quer que seja”. Trump voltou a defender Bolsonaro na terça-feira (8), pedindo que deixassem Bolsonaro em paz. 

“Eu conheci e lidei com o ex-presidente Jair Bolsonaro e o respeitava profundamente. A forma como o Brasil tratou o ex-presidente Bolsonaro, um líder altamente respeitado em todo o mundo durante seu mandato, inclusive pelos Estados Unidos, é uma vergonha internacional. Este julgamento não deveria estar acontecendo. É uma caça às bruxas que deve terminar IMEDIATAMENTE!”, afirmou Trump.

O governo Lula respondeu à publicação convocando o encarregado de negócios da Embaixada dos EUA, Gabriel Escobar, para consultas oficiais sobre as declarações de Trump.

Horas depois, Trump anunciou a taxação de 50% aos produtos brasileiros e voltou a defender Bolsonaro. 

Oposição afirma que Lula tenta criar inimigo externo para encobrir crise econômica

Segundo parlamentares ouvidos pela reportagem, Lula deve agora classificar Trump como um inimigo externo para tentar recuperar sua popularidade e tirar o foco de problemas econômicos do Brasil. Eles afirmam que a taxação imposta por Trump aos produtos brasileiros é resultado da política externa “desastrosa” do governo petista.

O presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, deputado Filipe Barros (PL-PR), afirmou que a taxação imposta por Trump é uma resposta direta ao governo Lula. “Não tenho a menor dúvida de que o Lula quer que o nosso país seja taxado, justamente para arranjar um culpado externo pelo seu próprio desastre econômico. No melhor estilo venezuelano, tenta justificar o fracasso da economia colocando a culpa no ‘imperialismo americano’”, disse à Gazeta do Povo.

Para Barros, a escalada na tensão entre os dois países tem motivação política. “Lula sabe que o Brasil vai mal das pernas. Entregou os ministérios para aliados políticos, inchou a máquina e agora precisa apontar culpados. Antes era o Campos Neto. Agora, Trump.”

Já o senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente nacional do PP, atribuiu a Lula o que classificou como isolamento do Brasil no cenário internacional e o acusou ainda de romper, pela primeira vez na história, a aliança estratégica com os Estados Unidos. Segundo Nogueira, a atual diplomacia brasileira estaria “colocando a ideologia acima dos interesses do povo” e se aproximando de regimes autoritários na América Latina.

“O senhor, presidente Lula, não perdeu uma oportunidade para atacar com palavras o presidente da maior economia do planeta. E, ao invés de diplomacia, preferiu apostar em ataques infantis contra um país muito mais poderoso e mais forte do que o Brasil”, escreveu em publicação nas redes sociais.

Ao tratar do assunto, o senador também preparou o terreno para a disputa eleitoral de 2026. “O povo brasileiro vai corrigir, se Deus quiser, essa sequência de barbaridades de sua política externa que cada vez mais se aproxima de ditadores e ditaduras e conseguiu a proeza de destruir a relação mais antiga do Brasil nas Américas, o primeiro país a reconhecer a nossa independência”, completou Nogueira.

Já o senador Eduardo Girão (Novo-CE) afirmou que o “consórcio” entre Lula e o STF gerou um “altíssimo custo”. “O Senado Federal é parte do problema por ter se omitido até aqui, mas pode se tornar a solução da crise pautando impeachment dos que desrespeitam a nossa Constituição!”, escreveu na rede social X.

[Fonte Original]

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