Ondas de calor incontroláveis. Caos hormonal. Relacionamentos sem sexo. Esses estereótipos sobre a menopausa são profundamente enraizados: e poucos são totalmente verdadeiros. Conversamos com ginecologistas, endocrinologistas, urologistas e outros especialistas sobre os maiores mitos que já encontraram sobre a menopausa.
— A menopausa pode causar sintomas em várias partes do corpo, e às vezes de formas inesperadas— diz Rebecca Thurston, vice-reitora de pesquisas em saúde da mulher e professora de psiquiatria na Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos.
Aqui está o que ela e os outros especialistas querem que os pacientes saibam:
Mito 1: é só onda de calor
Ondas de calor são uma marca registrada da menopausa: até 80% das mulheres as sentem. Mas há muitos outros sintomas menos conhecidos relacionados à menopausa, como insônia, mudanças de humor, névoa mental, ressecamento vaginal, dores nas articulações e mais.
Isso acontece principalmente porque a menopausa é impulsionada por alterações nos níveis de estrogênio, que afetam todos os tecidos do corpo. Durante a perimenopausa, os anos que antecedem a última menstruação, o estrogênio oscila bastante. Após a menopausa, ele se estabiliza em um nível mais baixo.
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— Infelizmente, muitas pessoas não conhecem a gama completa de sintomas que esse processo pode causar — diz a endocrinologista JoAnn Manson, professora da Harvard Medical School. — Isso pode fazer com que elas não percebam que certos sintomas têm relação com a menopausa, e deixem de buscar tratamentos que podem ajudar.
Mito 2: “tudo” é sintoma da menopausa
— Até pouco tempo atrás, muitos sintomas femininos eram ignorados ou mal interpretados como algo não relacionado aos hormônios — diz Anna Barbieri, ginecologista e médica de medicina integrativa em Nova York.
Mas agora alguns médicos se preocupam com o movimento contrário.
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— O pêndulo está indo para o outro extremo: “Tudo é menopausa e perimenopausa”, e isso também é uma simplificação excessiva — diz Barbieri.
Por exemplo, dores nas articulações na meia-idade podem estar ligadas à queda do estrogênio, mas também podem indicar artrite.
Pelin Batur, professora da Clínica Cleveland, relata casos em que sintomas como fadiga foram atribuídos à menopausa, quando exames simples poderiam ter identificado anemia, problemas na tireoide ou deficiência de vitaminas como causas reais.
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Mito 3: a terapia hormonal é perigosa
Até 2002, médicos prescreviam rotineiramente terapia hormonal para sintomas da menopausa. Mas um estudo amplamente divulgado encontrou pequeno aumento nos riscos de câncer de mama e coágulos sanguíneos entre mulheres que tomavam estrogênio e progestina.
O uso caiu drasticamente: e o medo persiste.
Na realidade, os especialistas dizem que os benefícios, como alívio das ondas de calor, ressecamento vaginal e redução no risco de osteoporose, superam os riscos para a maioria das mulheres entre 40 e 50 anos com sintomas incômodos.
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— Algumas mulheres mais velhas também podem se beneficiar com segurança — diz Lauren Streicher, da Universidade Northwestern.
Embora existam grupos, como sobreviventes de câncer de mama, para os quais a terapia hormonal sistêmica não é recomendada, esses casos são a exceção.
E existem muitas formas de terapia hormonal. Por exemplo, pílulas de estrogênio aumentam a produção hepática de proteínas de coagulação: um risco para quem tem propensão a coágulos, mas adesivos de estrogênio não causam esse efeito.
— Estrogênio vaginal em baixa dose é seguro para todas — explica a urologista Rachel Rubin.
Mito 4: os hormônios são a única opção de tratamento
— A terapia hormonal não é nem milagrosa, nem venenosa — adverte Jill Liss, da Universidade do Colorado. — Pode transformar a vida de algumas mulheres, ser desnecessária para outras, ou até arriscada.
E para aquelas que não se beneficiam, há alternativas.
Ondas de calor podem ser tratadas com gabapentina (um anticonvulsivante), paroxetina (um antidepressivo), terapia cognitivo-comportamental e exercícios respiratórios. Em 2023, a FDA aprovou o fezolinetant, que age diretamente nos neurônios que regulam a temperatura. Já a secura vaginal pode ser tratada com produtos à base de ácido hialurônico.
Mito 5: tratamentos “naturais” são mais seguros
— Com medo dos hormônios, muitas mulheres buscam ervas e suplementos. Mas o fato de algo ser rotulado como natural não significa que seja seguro — alerta Manson. — Arsênico também é natural.
A maioria dos suplementos promovidos por influenciadores não tem comprovação científica sólida, como explica a médica Nanette Santoro. E como esses produtos são pouco regulados, podem até estar contaminados.
Com o abandono dos hormônios aprovados pela FDA, muitas recorreram aos “bioidênticos”: hormônios com a mesma estrutura dos produzidos pelo corpo. Farmácias de manipulação promovem esses produtos como mais seguros que os derivados de estrogênio de origem animal, mas os estudos não comprovam isso.
— Sabe qual o principal motivo pelo qual dizem que os hormônios manipulados são mais seguros? — brinca Mary Jane Minkin, da Yale. — Eles não vêm com a bula listando todos os efeitos colaterais.
Mito 6: você só precisa aguentar firme
Muitas mulheres acham que precisam suportar a menopausa sozinhas. Mas isso pode gerar problemas sérios.
Mulheres com ondas de calor frequentes têm maior risco de doenças cardiovasculares e problemas de memória, principalmente se as ondas ocorrem à noite.
— A falta de sono está associada a doenças cardíacas, diabetes e declínio cognitivo, e podem haver outros fatores envolvidos — diz Thurston.
A secura vaginal, por exemplo, aumenta o risco de infecções urinárias. Mesmo quem não sente sintomas perceptíveis costuma apresentar perda de massa óssea e alterações metabólicas na menopausa.
Testes e tratamentos podem reduzir esses riscos. É um momento crucial para cuidar da saúde: comer bem, se exercitar, monitorar a pressão e o colesterol.
Mito 7: os sintomas duram pouco
Muitas mulheres acham que as ondas de calor serão passageiras. Mas, em média, duram mais de sete anos: e às vezes bem mais.
— Outros sintomas podem durar ainda mais. Infecções urinárias, por exemplo, são comuns em mulheres mais velhas devido à menopausa, mas muitas não percebem a conexão — segundo Elizabeth Evans. — Você vê uma mulher de 70 anos dizendo: “já passei dessa fase, por que estamos falando de menopausa?”.
— E os sintomas podem começar antes do que se espera. Apesar da última menstruação geralmente ocorrer após os 45 anos, é comum notar sintomas da perimenopausa a partir dos 35 — diz a médica Stephanie Faubion. — Muitas mulheres são invalidadas nesse processo. Se uma paciente de 37 anos se queixa de alterações de humor ou insônia, dizem que é impossível ser menopausa, e não é.
Mito 8: Sua vida sexual nunca mais será boa
— Dor durante o sexo é comum na menopausa, e as pessoas costumam ter menos desejo espontâneo — diz a médica Diana Bitner. — Isso pode gerar um ciclo vicioso: quanto menos sexo, menos vontade de ter.
Mas isso pode ser revertido. O diálogo aberto com os médicos é essencial.
Hidratantes, lubrificantes e estrogênio vaginal ajudam com dor e ressecamento. E a testosterona, embora não seja aprovada pelo FDA para sintomas da menopausa, é usada fora da bula para tratar a libido.
Mito 9: mulheres na perimenopausa não engravidam
Batur já atendeu várias pacientes que ficaram meses sem menstruar, achavam que estavam na menopausa, e apareceram grávidas.
Mesmo com ciclos irregulares, é possível engravidar na perimenopausa. Um estudo de 2015 mostrou que, depois das adolescentes, as mulheres na faixa dos 40 são as mais propensas a gravidez não planejada.
— Tudo o que é preciso é um óvulo e um espermatozoide — diz Batur.
A gravidez só deixa de ser possível após a perimenopausa, quando se completa um ano inteiro sem menstruar (sem interferência de outras condições).
Mito 10: A menopausa é sempre horrível
— As representações culturais da menopausa costumam ser sombrias. Para além dos sintomas, ela é descrita — segundo Thurston. — como “um período de decadência e perda”. Mas os sintomas não são toda a história. Muitas mulheres se sentem mais autênticas e confiantes.
Segundo Thuston, elas se importam menos com o que os outros pensam.
— E isso é libertador — diz.
E há outras vantagens. Afinal, quem nunca desejou o fim dos sofrimentos menstruais enquanto se encolhia com cólica agarrada a uma bolsa de água quente?