O empresário Renê Nogueira Júnior, que confessou ter atirado no gari Laudemir de Souza Fernandes, em agosto, disse durante audiência do caso que pegou a arma da mulher, a delegada Ana Paula Balbino, enquanto ela tomava banho porque estava com medo de uma ex-sócia. O executivo não respondeu perguntas do interrogatório, mas deu sua versão sobre o que o motivou a sair armado. Ele relatou ter sido ameaçado e, depois de preso, coagido a confessar o crime.
O crime ocorreu em 11 de agosto. Laudemir levou um tiro e não resistiu aos ferimentos depois da suposta briga de trânsito. Testemunhas contaram que Renê ficou irritado por não conseguir passar com o carro enquanto o gari e seus colegas faziam a coleta de resíduos no bairro. Ele ameaçou a motorista do caminhão de lixo antes de abrir fogo contra os profissionais e ferir a vítima. O empresário foi preso horas depois, numa academia de alto padrão da capital mineira.
Renê é réu por homicídio triplamente qualificado, ameaça e fraude processual. A Justiça de Minas Gerais realizou, nesta semana, audiências de instrução e julgamento do caso. Agora, deverá decidir se o executivo será julgado no Tribunal de Júri.
Na audiência, da qual participou via videoconferência, Renê alegou que pegou a arma porque, segundo ele, havia sofrido ameaças de uma ex-sócia que dizia ter ligação com o jogo do bicho.
— Eu abri um boletim de ocorrência por ameaça contra ela (a ex-sócia). Ela me disse que tinha relacionamento com o jogo do bicho, que recebia malas e mais malas de dinheiro e que, se eu tentasse levar algo adiante, faria algo contra mim. (…) Quando ela me falou isso, eu conversei com a minha esposa (…), me orientou: ‘Faça tudo direitinho, vá à polícia, registre a ameaça’. Só que ficamos preocupados — disse ele.
Renê disse ter saído armado porque aquele dia era uma das primeiras vezes em que iria trabalhar presencialmente numa nova empresa. No caminho, segundo ele, passaria pela cidade onde mora a ex-sócia, conforme a íntegra da declaração, obtida pelo jornal O Tempo.
— Foi essa a motivação para eu ter pegado a arma de forma escondida. Ela (Ana Paula) estava tomando banho. Ela não tem nada a ver com isso. Foi algo que eu realmente fiz naquele dia, com medo de encontrar quem me ameaçava — afirmou.
O empresário negou que tivesse cometido o crime por se irritar com a demora e o trânsito gerado pela ação dos garis.
— Nunca tive nenhuma ocorrência, talvez nem multa. Eu não iria, em momento nenhum, brigar com alguém por causa de segundos parado atrás de um caminhão. Jamais. (…) Só na minha rua, naquele dia, fiquei meia hora. (…) E nem por isso fiz qualquer coisa — alegou ele.
Testemunhas de acusação foram ouvidas na terça no 1º Tribunal do Júri Sumariante, no Fórum Lafayette Criminal e de Família, no Centro de Belo Horizonte. Na quarta-feira, foram ouvidas as testemunhas de defesa.
Tiago Lenoir, que representa a família da vítima, diz ter “plena convicção que a justiça será feita”.
— A família do gari Laudemir recebe o início das oitivas com um sentimento de alívio e esperança, porque este é o momento de reconstruir, em juízo, fatos que já estão bem delineados no inquérito. As testemunhas se encaixam de forma precisa com todas as provas já produzidas, mostrando um conjunto sólido e coerente. Todos os elementos do crime estão fartamente demonstrados, e a expectativa é de que, ao final da instrução, o acusado seja pronunciado e encaminhado ao Tribunal do Júri — destacou Lenoir.
O GLOBO tenta contato com a defesa de Renê.
A mulher do empresário, a delegada da Polícia Civil de Minas Gerais Ana Paula Balbino, foi indiciada por prevaricação, por não ter agido embora soubesse que o marido era suspeito do crime, e por posse ilegal de arma, já que a pistola utilizada no caso pertencia a ela. Ela não foi denunciada porque o Ministério Público avaliou ser possível negociar os termos de um Acordo de Não Persecução Penal.
Ao oferecer a denúncia, a promotoria pediu que Renê seja julgado no Tribunal do Júri e pague ao menos R$ 150 mil à família do gari, se for condenado.
Mensagens obtidas pela polícia mostraram que ele orientou a mulher a entregar a investigadores outra arma, que não a pistola utilizada no disparo contra o gari, de calibre .360. O MP considerou que o crime foi cometido por motivo fútil, em via pública e com uso de arma ilegal. A perícia comprovou que o armamento pertencia a Ana Paula. Segundo a Polícia Civil de Minas Gerais, a delegada sabia que o marido usava as armas dela com frequência.
O empresário se exibia em vídeos com armas e com o distintivo da mulher. Os investigadores que o indiciaram pelo homicídio ressaltaram que o executivo tinha “fascínio” por armamentos e pelo cargo da companheira.