Acervo pessoal
Acessibilidade
Mais de 250 casos de intoxicação por metanol após o consumo de bebidas alcoólicas adulteradas já foram notificados no Brasil, entre registros em investigação e confirmados, segundo o Ministério da Saúde. Até a última quarta-feira (8), o órgão contabilizava cinco mortes confirmadas em São Paulo e outras 11 sob investigação.
Diante do alerta, universidades e órgãos públicos intensificam a busca por soluções capazes de detectar o composto e conter novos casos. Mas, muito antes da atual crise, a mestre em química Larissa Alves de Mello Modesto já havia se antecipado ao problema: ela liderou o desenvolvimento de um teste rápido, acessível e preciso para identificar metanol em bebidas e combustíveis.
A tecnologia foi criada no Instituto de Química da Unesp, em Araraquara, durante o mestrado da pesquisadora, iniciado em 2018. “Esse método é uma reação química, só que ela funciona na mão de qualquer pessoa”, afirma Larissa. “O público geral às vezes fala ‘química é difícil, não gosto’. Mas, nesse caso, até uma pessoa com o mínimo de treinamento consegue operar um kit para gerar um resultado que pode auxiliar em uma tomada de decisão tão importante.”
“Abracei esse projeto porque queria poder tornar a ciência, principalmente a química, acessível para o público geral.”
Larissa Alves Modesto

Acervo pessoal
Larissa apresentou o projeto durante a reunião anual da Sociedade Brasileira de Química, em 2019
Como funciona o teste para detectar o metanol
O método desenvolvido pela equipe de Larissa é colorimétrico — ou seja, a reação química provoca uma mudança de cor visível a olho nu. Em apenas 15 minutos e com um custo estimado de R$ 10, o teste indica se há metanol em bebidas como cachaça, uísque e vodca, além de combustíveis como etanol e gasolina.
Quando aplicado, o reagente interage com a amostra analisada: se o líquido apresentar coloração roxa, significa que o teor de metanol ultrapassa o limite permitido pela Anvisa (20 miligramas a cada 100 mililitros em bebidas alcoólicas). O resultado dispensa equipamentos laboratoriais complexos, o que o torna ideal para inspeções em campo, pequenas destilarias e órgãos de fiscalização.
O processo segue os padrões da Anvisa, que define critérios para validação de métodos analíticos. O método também foi validado conforme as diretrizes do Ministério da Agricultura.
O estudo, concluído em 2022 após atrasos provocados pela pandemia, resultou em um kit de detecção patenteado, ainda sem parceiro comercial para produção em larga escala. “O próximo passo é encontrar uma empresa parceira que queira adaptar essas reações para um kit facilitado para o público geral”, explica. “Por exemplo, teria que ser copinhos já com a demarcação pronta, reagentes bem didáticos e manual de instruções.”
Uma trajetória marcada pela ciência
Graduada em química pela USP, Larissa iniciou o mestrado na Unesp em 2018, onde desenvolveu dois métodos colorimétricos distintos para identificar metanol em diferentes produtos — de combustíveis a bebidas e vinagres —, ambos registrados como patentes junto ao INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). “Quando saí da graduação, fui fazer estágio, mas achei que precisava do mestrado na área analítica para conseguir um emprego melhor”, lembra. “A pesquisa surgiu quando eu e meus orientadores recebemos uma demanda da Agência Nacional do Petróleo, que queria um método rápido de aplicação em campo para determinar metanol.”
Larissa também acumulou experiência fora da universidade. Na Embrapa, participou do projeto de aperfeiçoamento e validação de um analisador fototérmico de biocombustíveis. Antes disso, trabalhou na indústria alimentícia, na empresa Loop Aromas e Sucos Concentrados. “Sempre quis ver a aplicação prática no mercado, por isso não continuei o doutorado e segui no setor privado.”